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Administradores incompetentes e subservientes – Século XVII

Carta-planta da Baía do Espírito Santo e suas proximidades com a referência Monte do Moreno

O abandono da capitania por parte dos donatários desencadeou novo processo de decadência. Não era de se esperar outra cousa, tão infelizes as escolhas dos administradores, preferentemente aliciados no seio de classe avessa à tarefa de governar. Regra geral, permaneciam meses, apenas, no posto, logo substituídos.

Cabe ressaltar, outrossim, a maneira assaz descortês e rude como os governadores gerais e vice-reis tratavam os capitães-mores. As cartas daqueles para estes – correspondência oficial, copiada nos livros do governo – estão repletas de admoestações deprimentes e ameaças escolares. Não raro, deparamos com ordens da mais alta autoridade da colônia para os seus subordinados imediatos – os capitães-mores – receberem de seus governados pequenas dívidas de terceiros... E lá vinham as prolixas e fastidiosas recomendações sobre a maneira de cobrar e o processo a ser obedecido quanto à remessa da importância recebida para a Bahia, transformando-se os delegados da Coroa em meros agentes cobradores (II). A subserviência não permitiu um protesto sequer contra prescrições tão deprimentes. Os homens a quem se confiava a administração da capitania não estavam à altura do posto... Outra fosse sua formação moral e intelectual, por certo se insurgiriam. Amoucos, obedeciam e se vingavam nos humildes, a exemplo do que fez Gregório de Távora, em 1651, maltratando tão grosseiramente a brancos e índios que “uns e outros se forão para o sertão de que resultou ficar esse districto quasi despovoado, e a barra exposta a qualquer acommetimento do Inimigo”.(16)

 

NOTAS

(16) - DH, III, 103. A esse tempo Gregório de Távora era capitão (da infantaria). Em 1656, possuía engenhos no Espírito Santo. A certa altura de uma carta escrita pelo conde de Atouguia, 20.º governador geral, ao capitão-mor Francisco Luís de Oliveira, a vinte e dois de fevereiro de 1656, se lê: “As vinte mil arrobas de assucar dos engenhos de Gregorio de Tavora” (DH, III, 319).

(II) Nas segunda e terceira décadas do século dezessete Manuel Maciel Aranha esteve no Espírito Santo. Quando do governo de D. Luís de Sousa, “estava ele, Manuel Maciel Aranha, na Bahia para ir como capitão-mor para a Capitania do Espírito Santo, se lhe dera ordem que nela fizesse ofício de provedor da Fazenda, para o que se lhe passara um regimento. Sucedendo no governo Diogo de Mendonça Furtado, se lhe ordenara, em 1622, que voltasse àquela Capitania para proceder a várias cobranças, e com efeito nela estivera oito meses, voltando à Bahia com uma caravela carregada de açúcar”.

O que estamos lendo consta do Papel sobre a fazenda Real do Brasil, da coleção de Os Manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval Respeitantes ao Brasil (obra em dois volumes publicada “por ordem da Universidade” (de Coimbra), em 1956) – (RAU, Manuscritos, I, 394-6).

O Papel continua, apresentando agora as Aduertençias que maes faço de grande importançia sobre a capitania do Spirito Santo. “Depois que os holandeses tinham entrado no Brasil, por duas vezes atacaram a vila de N. S. da Vitória, na Capitania do Espírito Santo, conseguindo os seus habitantes rechaçá-los. Era natural que o tentassem uma outra vez, sabendo a pouca força que havia na Capitania e que não podia ser socorrida da Bahia, nem do Rio de Janeiro, por ficar muito distante. Ficava a Vila numa Ilha onde o inimigo não podia desembarcar senão pela parte do Rio, onde estavam umas lajes sobre as quais se podia fundar um forte que impedisse a entrada para além do penedo que se chamava Pão de Açúcar. Antes de aí chegar havia umas paragens onde se podiam fazer embarcações por não faltar madeira de toda a qualidade, assim como pau-brasil que se navegava em grande quantidade para o reino. Por ficar a Capitania a meio caminho entre a Bahia e o Rio de Janeiro e ser a melhor região que havia do lado sul, era pois natural que o inimigo a tentasse acometer de novo. Por estas razões convinha que el-Rei a mandasse socorrer com tudo o que fosse necessário, e com um capitão de confiança e experiência. Como na vila não havia mais do que uma companhia de presídio, que diziam não chegar a ter trinta soldados, devia-se prover pelo menos de outros tantos, pois os moradores capazes de tomar armas não eram mais de duzentos, segundo se recordava de quando ali estivera como capitão-mor, fortificando a Capitania e organizando três companhias militares, cujo comportamento sempre fora exemplar. Este motivo e o seu zelo de bons portugueses quando da feliz aclamação de S. Majestade, o levavam a pedirlhe que lhes concedesse o privilégio de infanções, com que honrara os moradores das Capitanias do Rio de Janeiro e Bahia, pois esta mercê lhes daria novo ânimo. Também era importante para a defesa prevenir os índios das quatro aldeias que os padres da Companhia tinham a seu cargo, pois eram muito valentes e causavam grandes estragos no inimigo com as suas flechas. Para conquistar a sua boa vontade, era necessário que o capitão os visitasse nas suas aldeias, levando alguns presentes para os principais e suas mulheres, que fora a maneira como agira quando ali estivera por capitão, sem fazer qualquer gasto à Fazenda Real. A expedição que se projetava para o descobrimento das esmeraldas constituiria um novo perigo para a Capitania, pois ficaria despovoada, oportunidade que o inimigo não deixaria de aproveitar. Parecia-lhe pois muito conveniente ordenar S. Majestade que tal entrada se não fizesse, enquanto o inimigo se encontrasse no Brasil.” S. l. n. d. (op. cit., vol. I, 394-6).

Não havíamos deparado ainda com esse personagem. É mais um nome na relação que agora se vai organizando dos capitães-mores que passaram pelo Espírito Santo e que, de volta a Portugal, continuou a se interessar pela terra que governara e mais tarde visitara como cobrador.

 

Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, julho/2017

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