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Ano de 1741 - Por Basílio Daemon

Capa do Livro - Província do ES, 1879 - Autor - Basílio Daemon

1741. É criada neste ano a comarca da Vitória nesta capitania do Espírito Santo, sendo a sede na vila da Vitória independente da do Rio de Janeiro e que abrangia todo o território compreendido nas vilas de Campos dos Goitacases, e São João da Praia ou da Barra. Só em outubro foi instalada, quando prestaram juramento e tomaram posse juntos o novo governador capitão-mor e ouvidor nomeado como se verá abaixo.(239)

Idem. É assassinado às 11 horas do dia 27 de junho deste ano o Dr. Manoel Pereira Botelho de Sampaio, que era juiz de fora da capitania, por Jerônimo Pereira de Barcelos.(240) Estando à janela de um sobradinho, que ainda hoje existe à rua Dois de Dezembro, antiga do Beco, número 14, duas irmãs do mesmo Jerônimo de Barcelos, passou o Dr. Manoel Pereira Botelho de Sampaio às 11 horas do dia e dirigiu um gracejo a uma das ditas moças a respeito de sua beleza; Jerônimo de Barcelos, que se achava do lado de dentro da dita casa, já prevenido contra o mesmo doutor, lançou mão de uma pistola e, chegando à janela, desfechou um tiro no Dr. Botelho, que logo ficou prostrado, vindo a falecer na madrugada do dia seguinte, 28 de julho. Em seguida, saiu Jerônimo de Barcelos dessa então sua casa, que tem frente para a rua Grande, hoje rua de Santa Luzia, e foi refugiar-se em casa de uma amásia sua, na rua do Carmo, enquanto que a cidade se alarmava e a soldadesca perseguia o criminoso para descobri-lo; alguns soldados chegaram à casa onde se tinha homiziado Jerônimo de Barcelos e, perguntando se o tinham visto passar, o mesmo Jerônimo apresentou-se-lhe[s] indicando ter visto o criminoso ir com direção à rua da Várzea; e aproveitando o ensejo em que os soldados dirigiam-se para o lugar indicado, montou a cavalo e partiu para uma situação que tinha em Santo Antônio, e aí se rodeou de capangas e escravos, vivendo por algum tempo sem ser visto, tendo a casa fortificada por grandes cercas e vigiada por cães bravos e amestrados, mas, não podendo resistir ao desejo de divertir-se em uma festividade de São Miguel, na qual se faziam umas cavalhadas, apresentou-se mascarado e correu igualmente com os outros; sendo bom cavaleiro, e tendo tirado um prêmio, foi oferecê-lo, propositalmente, ao próprio governador que se achava em um palanque erigido na praça de Afonso Brás. Reconhecendo-o o governador, que tinha feito todo o possível para que ele fosse preso, deu nessa ocasião providências acertadas no sentido de capturá-lo, o que se efetuou não sem alguma resistência, sendo Jerônimo de Barcelos, em um navio, conduzido preso e algemado para a Bahia acompanhado de um escravo que lhe fora sempre muito fiel. Ao chegar o navio à altura de Caravelas e aí fundeando à noite, o dito escravo, tomando nos braços o senhor, atirou-se com ele ao mar, e com ele nadando para a terra salvaram-se, sendo aí hospedado Jerônimo de Barcelos por um dedicado amigo que lá tinha e onde demorou-se algum tempo; daí voltou, afinal, para a capitania onde viveu em sua situação até a morte, rodeado sempre de capangas e guardado por grandes cães de fila, a fim de não ser surpreendido. Alguma fortuna que possuía a família foi consumida em ver se obtinham o perdão, vindo finalmente a morrer quase que em pobreza completa. Jerônimo de Barcelos contraíra matrimônio mesmo criminoso e teve filhos, existindo ainda hoje sua descendência, pois pertencia a uma família das mais importantes da capitania.

Idem. Tendo sido criada a comarca do Espírito Santo, e nomeados no ano antecedente governador-regente e capitão-mor Domingos de Morais Navarro e também ouvidor da comarca o qual era do Desembargo do Estado do Brasil, provedor da Fazenda Real e da dos defuntos e ausentes, Dr. Pascoal Ferreira de Veras,(241) prestam ambos juramento perante os oficiais da Câmara e mais autoridades no dia 4 de outubro deste mesmo ano, como se vê do Livro de Registro de Juramentos, instalando-se assim com o maior regozijo a nova comarca. Fica, portanto, sanado mais este engano na história desta província.

Idem. Faz em fins deste ano o primeiro ouvidor da nova comarca da Vitória, Pascoal Ferreira de Veras, uma devassa a respeito do fogo ateado nas casas de morada à rua da Várzea, hoje Sete de Setembro, pertencentes a Roque da Fonseca e Catarina Paz, de cujo crime era acusada Marcela, parda, escrava de Manoel Teixeira de Barcelos. Este incêndio ia-se comunicando a muitos outros prédios como se vê da sentença ou carta de seguro lavrada e datada no ano seguinte, a 14 de outubro de 1742.

 

Notas

 

239 “Em 1741 foi criada a comarca do Espírito Santo compreendendo a capitania da Paraíba do Sul…” [Notas sobre a fundação da capitania do Espírito Santo] (b) “Criou-se a comarca do Espírito Santo pelo ouvidor Pascoal Ferreira de Veras, que tomou posse em 3 de outubro, e na demarcação que lhe fez unir as vilas de S. João e S. Salvador de Campos de Goitacases.” [Rubim, B. C., Notícia, p. 342]

240 “...que homiziado, em Santo Antônio na fazenda do padre Gomes de Aguiar, parente dele, conseguiu escapar à devassa que o desembargador Pascoal Ferreira de Veras veio, da Bahia, promover.” [Freire, Capitania, p. 188]

241 No original está Deveras, que corrigimos de acordo com o documento Criação da Ouvidoria do Espírito Santo, 15 de janeiro de 1732. O mesmo fizemos no item seguinte.

 

 

Nota: 1ª edição do livro foi publicada em 1879
Fonte: Província do Espírito Santo - 2ª edição, SECULT/2010
Autor: Basílio Carvalho Daemon
Compilação: Walter de Aguiar Filho, novembro/2019

 

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