Morro do Moreno: Desde 1535
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As ruínas e o engenho do Morro do Moreno

Engenho operado por força hidráulica era um engenho real - Ilustração: Mônica Mol

Quando garoto, ouvia meu pai dizer que ao pé do Morro do Moreno existiam ruínas, vestígios de grossas paredes cobertas por matagal. Segundo os antigos, as ruínas pertencia à casa e ao engenho do velho Vasco.

Basílio Daemon, em seu livro "Província do Espírito Santo" publicado em 1879, fala dessas ruínas. Como se vê, embora a vila haja florescido na Prainha, à sombra do Morro do Moreno permaneceu  o capitão em sua casa. Ali administrava também o engenho. Antes, havia a preocupação de se construir tudo, inclusive os engenhos , nas proximidades do litoral devido à necessidade de contato com os navios que vinham da Metrópole. Pouco depois, por determinação do Reino e por uma questão de segurança, os engenhos passaram a ser construídos distantes da orla marítima, em terrenos onde houvesse água que possibilitasse a moagem da cana e a fabricação dos tijolhos e telhas. Longe do litoral era mais fácil proteger a produção do açucar da pilhagem dos estrangeiros. O engenho era um investimento muito caro e nosso açucar era de primeiríssima qualidade.

Torna-se realmente curioso saber como funcionava um engenho em meados do século XVI, tendo em vista a precariedade da época e a vivência  numa região selvagem, tão longe do mundo civilizado.

Segundo os estudiosos do assunto, o engenho poderia ser movido por tração animal, sendo então conhecido por "trapiche". Quando operado por força hidráulica era um "engenho real". Nesse caso, conforme a altura da qual a água despencava sobre a palhetas da roda que movia a moenda, denominava-se "copeiro" ou "meio-copeiro". Na falta de queda d'água, quando a roda era adaptada a correnteza para ser movimentada, o engenho era chamado de "rasteiro". Não há notícias de terem vindo na caravela "Glória" animais bovinos ou equinos, possibiliodade, aliás, muito remota, por não haver condições de transportar no veleiro cerca de sessenta pessoas juntamente com animais de grande porte, além das provisões necessárias a subsistência dos colonos. Pouco depois os animais vieram sim, provavelmente de outras capitanias, mas não se sabe quando. Conforme informa Pero Magalhães Gândavo no "Tratado da Terra do Brasil", livro escrito mais ou menos em 1570, em todas as capitanias havia bois e vacas e, embora existissem também cavalos e éguas, estes eram mais raros e por isso mais caros. Vasco Coutinho Filho, o segundo donatário, emtestamento feito a 19 de abril de 1573, em Lisboa, referiu-se à existência de gado em sua capitania. Mas quando fez tal afirmativa haviam decorrido trinta e oito anos contados da data do começo do povoamento. Estou assim convencido da inexistência de bois ou vacas nos dois primeiros anos de colonização do Espírito Santo. Eis por que o engenho não podia ser um "trapiche" e, não existindo também uma ravina nos arredores da povoação, estava eliminada a possibilidade de um "copeiro" ou de "meio-copeiro". Seria então um "rasteiro" ou uma moenda movida pela força física dos colonos.
Possivelmente o Ribeiro da Costa (1), naquela época, fosse caudaloso o suficiente para que sua correnteza girasse uma roda de engenho. Talvez as altas precipitações pluviométricas da época criassem condições de engrossar o volume de água no riacho e assim permitir a instalação de um engenho "rasteiro". A meu ver duas são as hipóteses para o tipo de engenho montado no Sítio do Ribeiro, ao pé do Morro do Moreno, em cujo o local o governador da capitania fixou também residência: o "rasteiro" ou movido à força física.

A última hipótese me parece mais razoável. A moenda era inicialmente impulsionada pelos braços dos colnos e, com a aproximação dos nativos, levados pela curiosidade, estes passaram a ajudar os portugueses girando a roda do engenho em troca de pequenos presentes que para eles eram sempre novidades. Entre o europeu e o aborígene passou a existir uma convivência pacífica. O panorama só mudou a partir do momento em que o colono lusitano, sem qualquer escrúpulo e habilidade, passou a impor sua vontade com atitudes violentas que resultaram na escravidão dos íncolas. Teve então como res´posta a guerra.
Se não fosse por sua estreiteza de visão, o colono teria continuado a contar com a colaboração do gentio embora, é forçoso reconhecer, a maioria mantinha-se arredia, sem desejar qualquer contato com os invasores de suas terras. Seria apenas uma questão de tempo até se obter uma ajuda mais ampla do selvagem. Mas, infelizmete, nossos primeiros povoadores, em sua maioria de precedentes nada recomendáveis, não tiveram a habilidade necessária para conquistar a simpatia e a confiança dos indígenas do Sul.

Na Praia da Costa, sobre a pedra das caiçaras, havia ainda vestígios de alicerces provavelmente de uma construção muito antiga (2). Até agora nada provavelmente encontrei em livros e desconheço a existência de documentos que revele algo sobre o assunto. Conversei com antigos moradores da cidade e com velhos pescadores, mas ninguém soube me dizer nada a respeito. Para mim, aquelas ruínas pertenciam a um posto onde ficava uma sentinela vigiando o mar para previnir a chegada de navios corsários e espreitando a praia para impedir ataques inesperados dos nativos. A pedra está em ponto estratégico e poderia muito bem servir para evitar ataques supresa.

Notas do Autor:

(1) - No passado, o Ribeiro da Costa tinha águas escuras porém limpas. Tem sua origem nos alagados existentes ao sul do município de Vila Velha. No seu curso contornava parte do Morro do Batalha (elevação hoje arborizada e localizada nos terrenos do Colégio Marista). Seguia sob a ponte situada na estrada que dava acesso à Praia da Costa e, mais adiante, passava entre a Penha e o Moreno, onde se encontrava com o mar. Esta situação perdurou até 1960, quando uma grande enchente provocada pelo transbordameto do Rio Jucu fez desabar parcialmente a ponte, que acabou sendo dinamitada para dar vazão às águas.

(2) - O Autor chegou a ver as ruínas, bem deterioradas pelo tempo. Hoje, porém, é impossível vê-las porque sobre a Pedra das Caiçaras foi edificado o Clube Libanês, inaugurado em 13 de novembro de 1965.

Fonte: Vila Velha seu passado sua gente, 2002
Autor: Dijairo Gonçalves Lima
Compilação: Walter de Aguiar Filho, julho/2014



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