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Breves notícias sobre o Contestado

Mapa realizado em 1940 pela Comissão Geográfica do Exército - Fonte: Walace Tarcisio Pontes

Em 1911 estabeleceu-se um convênio entre os Estados, no qual se apelava para uma decisão arbitral que, finalmente, em 1914, julgou os limites ao sul do rio Doce na forma praticamente estabelecida pelo auto de 1800 e ao norte do rio Doce “pelas linhas de cumeadas da serra do Souza ou dos Aimorés, preenchidas por linhas retas e as soluções de continuidade”.

Portanto, em verdade, tudo permanecia nas linhas gerais do Auto de Demarcação de 1800.

Na década de 20 e 30 aquela imensa floresta a noroeste do Espírito Santo era praticamente desconhecida do homem branco colonizador, mas criou-se um marco importante: a construção da ponte sobre o rio Doce, na vila de Colatina, em direção ao norte, possibilitando a entrada naquela imensa floresta atlântica no ano de 1928, tanto que no rio São José, no lugar denominado Águia Branca, houve uma fixação de poloneses pela Sociedade de Colonização de Varsóvia.

Vê-se, portanto, que a partir de 1928 os capixabas iniciaram sua marcha em direção ao noroeste (a partir de Vitória), pois a floresta permitia a extração de madeiras de alto valor comercial e possibilitava a plantação de lavouras cafeeiras e lavouras brancas, transformando aquelas áreas selvagens em áreas de cultivos.

Com a penetração das populações capixabas e mineiras naquela imensa área, para ocupação da mesma terra, os Estados do Espírito Santo e Minas Gerais se motivaram para reconhecer aquelas posses como sendo áreas suas, daí decorrendo o nome de Área Contestada.

Todavia, é verdadeiro que a divisa era pela serra dos Aimorés, e a população colonizadora mineira atravessara essa serra e se fixara, portanto, em terras do Espírito Santo.

O Estado de Minas foi irredutível e mandou tropas militares para a manutenção daquela área ocupada como sendo de Minas Gerais. O Estado do Espírito Santo, por sua vez, também mandou suas tropas para aquela região para legítima manutenção das terras ocupadas pelos capixabas.

Assim os vilarejos, as vilas, as pequenas cidades que vicejavam naquela imensa área cortada por estradas tortuosas e de precária penetração na floresta, tinham dificuldades imensas de comunicação com os centros urbanos, ficando praticamente a mercê da violência local que se apresentava como um dos principais elementos negativos, por falta de apoio da civilização, propiciando aos mais fortes uma situação que modificava o destino da área do Espírito Santo, resvalando para as mãos de aventureiros de Minas Gerais.

Nos anos de 1937 e 1938 ocorreram incursões de policiais mineiros pelas vilas e cidades capixabas, como Barra de São Francisco e outras, a mando de autoridades subalternas mineiras próximas à fronteira indivisa, reprimindo a população capixaba.

Duas cidades se destacaram como referenciais na região Contestada – Barra de São Francisco pelo Estado do Espírito Santo e Mantena por Minas Gerais. Ambas cortadas pelo mesmo rio, de nome São Francisco, distando uma da outra apenas 12 km. A cidade de Mantena era sede de Distrito do município de Barra de São Francisco com o nome de Gabriel Emílio, quando da criação do Município em 1943, desmembrado do Município de São Mateus, de onde era Distrito desde 1935.

O Município e a Comarca de Barra de São Francisco foram instalados no ano de 1944.

Por outro lado, a cidade de Mantena teve início com a criação do “Patrimônio de Santo Antônio de Mantena” pelo trabalho dos “Capuchinhos” (ordem religiosa de catequese) ligada ao Aldeamento de Itambacurí que se tornou Município no mesmo ano de 1944. A rivalidade entre os dois Estados era estimulada e intensificada nessas duas cidades fronteiriças.

Na região Contestada foi estabelecido um sistema político-social pioneiro no qual ambos os Estados procuravam proteger suas populações e suas posses geográficas, culminando na distinção de três áreas: região de jurisdição administrativa puramente capixaba, região de jurisdição puramente administrativa mineira, e entre elas uma região mista administrada por Minas Gerais, por um lado e pelo Espírito Santo, do doutro, uma independente da outra, onde praticamente cada Estado concorria com a sua capacidade de administração, com construção de estradas pioneiras e de escolas, policiamento, inscrição de eleitores, cartórios e aplicação ou não de tributos sobre os bens produzidos, principalmente o café e a madeira comercial.

Assim, foi criada no Contestado, pela população, uma situação “statos quo” pela qual a situação ficava praticamente imodificável.

Embora o “statos quo” revelasse a intenção de deixar que as coisas ficassem como estavam, por baixo dessa superfície de ordem pratica e até de cunho administrativo, o movimento social e aventureiro naquela região era grande, principalmente na indústria extrativista da madeira de lei e na produção e comercialização do café, gerando sempre agitação do povo, no sentido de uma solução definitiva para a região Contestada, que pudesse tranquilizar o ser humano em seus anseios de vivência estável.

Nos idos de 1957 quase houve luta armada na região entre Mantena e São Francisco: tropas milicianas dos dois Estados prepararam-se para o confronto com armas consideradas à época como “pesadas”, tudo motivado pela fiscalização capixaba, no lugar denominado Café Ralo, ter exigido o pagamento de impostos para a passagem de café pilado da região de Água Doce, Santo Onofre, Santo Agostinho Azul, Bom Destino e outros lugares, para Mantena, que costumeiramente comprava esses cafés sem qualquer tributo aplicado pela fiscalização do Estado do Espírito Santo, pois consideravam aquele local como região de “jurisdição mista”, de livre negociação pelos produtores e comerciantes, tanto de Mantena como de Barra de São Francisco.

Tal fora a intensidade do movimento policial que se prolongou por muitos dias fazendo com que a população de Barra de São Francisco, temerosa de um desfecho armado, se retirasse para outros lugares, abandonando suas casas de moradia e o comércio citadino fechando suas portas.

No ápice dos preparativos armados ocorreu a intervenção de autoridades federais que bloquearam aquela situação intangível, insustentável e desmesurada, impedindo o desfecho de uma batalha que, por certo, seria sangrenta. A situação, então, estabilizou-se no “statos quo”, tendo a administração capixaba, recuado no exigir tributos dos cafés na região denominada “Café Ralo”, com trânsito via Mantena.

Com o advento do Estado Novo a nova Constituição de 1937 dispunha no Artigo 184 que os Estados continuavam na posse dos territórios onde exerciam sua jurisdição, vedando qualquer reivindicação territorial. E ainda declarava extinta as ações de litígios entre os Estados e admitia o Serviço Geográfico do Exército para descrever os limites dos Estados onde existiam conflitos.

Em 1940 a Comissão Geográfica do Exército, a pedido dos interessados, iniciou os trabalhos demarcatórios do Contestado, acompanhada pelo brilhante engenheiro e professor Cícero Moraes pelo Espírito Santo e Benedito Quintino por Minas Gerais.

A Comissão fez um levantamento “in loco” de toda região Contestada e apresentou um minucioso Laudo Demarcatório, em 1941. Esse Laudo do Serviço Geográfico do Exército baseou-se em três aspectos fundamentais: aspecto histórico, aspecto geográfico e aspecto jurisdicional.

O Laudo da Comissão do Serviço Geográfico do Exército foi aprovado pelo Governo de Getúlio Vargas e encaminhado ao ministério da Justiça para providenciar a publicação do mesmo. Segundo dizem alguns noticiadores, referido Laudo nunca foi publicado porque as forças ocultas da política mineira impediram sua publicação, apesar do esforço do Estado do Espírito Santo. Com o fim do Estado Novo e o advento da nova Constituição de 1946, Minas Gerais inconformada com aquele respeitável Laudo Pericial, postulou ação no Supremo Tribunal Federal para solução do “Contestado”.

Nessa ação, em 1958, o Estado do Espírito Santo pelos seus advogados, Rubens Ferraz, Cícero Moraes e Raul Ribeiro, apresentaram razões finais que, de tão perfeitas e brilhantes, foram transformadas em livro com o nome próprio para a questão, afirmando:

“A SERRA DOS AIMORÉS, UMA BARREIRA”.

Todavia, a questão lindeira terminou por acordo firmado em 15 de setembro de 1963, com o então Governador do Estado do Espírito Santo, Francisco Lacerda de Aguiar, vulgo “Chiquinho” e José Magalhães Pinto, de Minas Gerais.

Nesse acordo, a população capixaba residente no Contestado nem sequer foi ouvida.

Segundo consta, pelo que foi descrito, a área litiginosa era de nove a doze mil quilômetros quadrados, sendo que o Estado do Espírito Santo deve ter cedido ao Estado de Minas Gerais entre três e cinco mil quilômetros quadrados, provavelmente, pois não há dados concretos absolutos...

Porém, de tudo que a história pôde sumariamente reservar sobre o Contestado, três fatos históricos ressoarão permanentemente na consciência política e cultural do capixaba: a SERRA DOS AIMORÉS, declarada como a verdadeira divisa, lá, imutável, para todos os olhares brasileiros, o Laudo do Serviço Geográfico do Exército e a imposição de Minas Gerais.

 

Fonte: Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo -  nº 56, 2002
Autor: Ezequiel Ronchi Netto
Compilaçâo: Walter de Aguiar Filho, outubro/2012 

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