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Fontes e Epidemias - Período Provincial no ES

Rua Duque de Caxias, no início do século XX

No governo de Felippe José Pereira Leal refaz-se o reparo da Fonte Grande e dessa vez, empregam-se 122 tubos de ferro fundido de 4’’ tornado-se a adução da água mais fácil. Grassava então a febre amarela com virulência nunca vista. Em cinco meses duzentas vítimas numa população de pouco mais de três mil almas! Foi mercê de Deus escaparem os restantes.

Cidade suja, sem esgotos, as fezes eram guardadas em tonéis de madeira à espera do despejo, à noite. Quintais cobertos de imundícies, moscas, mosquitos, ratos, lixo por todas as ruas, matagal em todos os terrenos baldios. A fama da cidade suja deslustrou, por muitos anos, o nome da Capital e do Estado. A pobreza havia crescido assustadoramente. Foi necessário ao Governo da Província contratar médico para atender à população. Os cemitérios regorjitavam de cadáveres. O presidente Leal pede à Assembléia lei para criar cemitério foram do perímetro urbano. A celeuma foi de arrepiar cabelos. O “cólera-morbus”, de 1854 ao ano seguinte, alastrou-se por toda a Província. O presidente Pereira de Barros, em ofício ao Ministro Couto Ferraz, enumera 1.541 vítimas, das quais 375 em Vitória.

Pela lei de 24 de julho de 1854, abria-se um crédito de 4:000$000, e em 1859 proibia-se o enterramento nas igrejas. É a origem do Cemitério de Santo Antônio, no morro do Pinto, hoje abandonado e transformado em favela. Dr. Fernandes de Barros, em 1861, no seu relatório, diz que tal comentimento havia absorvido 20:000$000! Para murá-lo foi preciso que S.M.D. Pedro II concorresse com um conto de réis de suas economias particulares.

É célebre o relatório do Dr. Manoel Goulart de Souza, enviado em 1876, ao presidente da província Dr. Manoel José de Menezes Prado. Aquele ilustre inspetor de Saúde Pública nos dá sugestivo quadro do estado sanitário da capital. Ouçamo-lo em alguns tópicos de sua exposição: “Como nos anos anteriores, de janeiro a março, manifestaram-se diversos casos de febre de fundo palustre; não podemos, entretanto, dizer que fosse mau o estado sanitário desta capital. Na passagem da estação quente para a fria, houve ainda casos de febres biliosas, propriamente chamadas dos países quentes, e o que é mais, diversos de febre amarela e que ainda hoje aparece um ou outro caso. A existência dessa moléstia entre nós foi por nós verificada e pelos distintos facultativos desta cidade a até hoje não menos de 16 ou 20 casos se têm manifestado, dos quais 6 ou 7 fatais”...

Depois de censurar o descaso dos edis, propôs, em sete itens simples, medidas protetoras de grande alcance. Transcrevo-os em homenagem ao autor e também para que se aquilate do estado sanitário capixaba naquele ano:

“Corre-me, pois, o dever de mais uma vez, lembrar alguns melhoramentos, como seguem:

I-            Impedir o despejo do lixo no cais frequentado da cidade, mandando construir pontes para esse fim; é verdade que já houve autorização para isso, e tendo eu sido incumbido, juntamente com o Sr. Dr. Florêncio Francisco Gonçalves, de escolher os lugares onde se deveriam construir essas pontes, cumprimos nosso dever, sem que, até hoje, nosso trabalho tenha correspondido à realidade.

II-          Fazer o calçamento em alguns lugares com declive suficiente para dar escoamento das águas nos tempos pluviosos, para não dar lugar a pântanos artificiais, como se observa nas Ruas da Mangueira, Alfândega e Largo da Conceição.

III-        Canalizar as águas da Fonte Grande, as quais descem por uma imunda vala, denominada Reguinho, receptáculo de tudo quanto nele se quer lançar.

IV-       Mandar fechar alguns cemitérios do centro da cidade, esses focos permanentes de exalações mefíticas, verdadeiros insultos à salubridade pública.

V-             Estabelecimento de um edifício a fim de nele serem recebidos os que primeiro forem atacados de alguma epidemia, sequestrando-os do resto da população, podendo ainda servir de lazareto, quando seja adotado o sistema de quarentenas.

VI-       Não consentir que os guardas fiscais durmam o sono da indiferença, não olhando eles para esses chiqueiros, que existem até nas áreas de casas particulares além do péssimo estado em que constantemente estão os mais quintais e praças da cidade.

VII-     Mandar canalizar as águas, que descem de um simulacro de chafariz, que existe em um canto da rua do Duque de Caxias, que nenhuma utilidade tem, e cujas águas por falta de declive ficam estagnadas na rua. São estas as medidas de urgência, não falando já do aterro do mangal do Campinho, essa obra que tanto aformoseamento traria à cidade a par dos benefícios à saúde pública!...

 

Levando-se em conta os conhecimentos de então, as medidas sugeridas pelo ilustre Dr. Goulart de Souza eram satisfatórias e suficientes. Pedia, em suma, um decreto proibindo hábitos nocivos, o calçamento de pequenos trechos de ruas, um dreno e uma casa de isolamento.

Apesar da ridícula despesa que tais medidas acarretariam não se fizera e não se baixou o decreto saneador. Os Governos tem ogeriza de gastar dinheiro em obras de supressão. A vaidade os impele para obras visíveis e suntuárias. Entre combater uma epidemia e construir um chafariz, no qual uma plaquinha de bronze lembre o idealizador, poucos são os que se decidem em favor do primeiro caso.

As obras de saneamento em geral são invisíveis, não satisfazem aos governadores, que amam a popularidade. Esgotos, drenos e aterros são subterrâneos: obras mortas embora garantam a vida, não falam porque jazem enterradas!

Nenhum governo, é bom que se registre, elaborou programa de saneamento integral para a cidade de Vitória, Os que a ele se dedicaram, Moniz Freire, Jerônimo Monteiro e Florentino Avidos, solucionaram partes de um conjunto de obras, que nunca foram consideradas no seu verdadeiro aspecto. Sanar uma cidade significa torná-la salubre. Parece fácil, e não é difícil mesmo realizar-se esse “desideratum”. É necessário, apenas, tenacidade e coragem para enfrentar preconceitos e interesse subalternos. As ferramentas principais são: dinheiro e vontade. O planejamento consciente responde pelo êxito. A medicina das cidades está capitulada na hoje triunfante arte de construí-las: urbanismo. O apelido é novo, mas os princípios norteadores são velhos de muitos séculos. Se o urbanismo atingiu a cátedra nos anos seguintes à guerra de 1914, não quer dizer que havia ignorância absoluta dos problemas urbanos até aquela data. Washington e Belo Horizonte foram edificadas antes do aparecimento do “urbanismo”, no conceito atual do substantivo. Vitrúvio escrevia a “De architectura”, dedicando-a a Cesar Augusto. Platão já dizia, em versão francesa: “Tout ce qui se fait, dans La cite, selon I’ordre et ladirection de La loi, ne peut avoir que de bons effets, tandis que tout ce qui n’ est pás reglé ou I’ est mal, fait tort a La plupart d’ autres reglements lês plus sagement ètablis”.

Havia, na antiguidade, verdadeiros códigos de posturas e regras de construir cidades.

Não se justificam os aleijões absurdos, perpretados por governadores municipais, A higiene elementar, a doméstica, digamos assim, independe de conhecimentos científicos. De Vitória, a situação era puramente lastimável. Verdadeira contradição à frase bombástica de Lord Disraeli, quando disse no parlamento inglês: “Saúde pública é o fundamento sobre o qual repousam a felicidade do povo e o poder do Estado”. Os edis capixabas pré-republicanos foram inoperantes. Descuidaram-se até das festividades públicas determinadas pela tradição e impostas pelo dever religioso. Já não se celebrava mais o feriado e Oito de Setembro, dedicado à Padroeira da Cidade. As procissões do S.S. Sacramento e de São Benedito dos Pretos, tradicionais e empolgantes, ficaram por conta das irmandades. Perderam o brilho com prejuízo para o sentimento popular e empobrecimento do nosso dicionário folclórico.

 

Fonte: Biografia de uma Ilha, 1965
Autor: Luiz Serafim Derenzi
Compilação: Walter de Aguiar Filho, outubro/2012 

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