Morro do Moreno: Desde 1535
Site: Divulgando desde 2000 a Cultura e História Capixaba

Impressões de Vitória – Por Taneco e João Bonino

Casa Flor de Maio

Dois homens, senhores do tempo, que acompanharam o desenvolvimento do Centro da Cidade, expressam a relação de suas vidas com a história da cidade.

José Hygino de Oliveira (Taneco), 85 anos. Alfaiate em Vitória por 60 anos. Sua alfaiataria se localizava na avenida Jerônimo Monteiro, 69.

 

"Vitória era uma cidade familiar, todo mundo se conhecia — isto até 1950. Todos se davam, era menos bruta. O movimento ficava restrito ao trabalho. Havia boêmia, e boêmios como eu nunca ultrapassavam da meia-noite, porque todos tinham seus afazeres. Era uma boêmia metrificada, havia família.

A minha alfaiataria possuía a melhor freguesia do Estado, começava a funcionar às 7 horas da manhã e não tinha hora para fechar. O comércio abria às 8 horas e fechava às 18 horas. Havia a casa Morgato Horta, que vendia artigos para vestuário masculino. A Flôr de Maio (obs.: a loja ainda existe e mantém o velho acento), vendendo até hoje artigos finos. A Morgadinho comercializava somente calçados femininos.

Tinha também a Madame Prado, senhora que atendia na praça Costa Pereira a camada feminina — até 1950 a mulher capixaba era considerada a mais elegante do Brasil por quem vinha a Vitória.

A Rainha das Flores, "mulher vulgar", porque se maquiava muito, não possuía família, faleceu pelos lados de Cachoeiro de Itapemirim como doida. De personalidade forte, era respeitada e sabia se respeitar. Vivia da caridade das pessoas, dormia onde escurecia.

No trânsito havia poucos automóveis, as pessoas se locomoviam principalmente de bonde. Na praça Oito existia um ponto de táxi. Havia o bar Glória, Café Colonial, o Café do AImeidinha. Vitória não tinha vida noturna.

O que chamávamos de vida noturna se resumia a visitas ao meretrício — começou na Duque de Caxias, depois passou para a General Osório, Caratoíra e Vila Rubim. Existia um rendez-vous famoso na Duque de Caxias, onde até as madames casadas se encontravam com seus queridos.

Em 1944 fui eleito um dos dez homens mais elegantes da cidade. Eu tinha três guarda-roupas, com 44 ternos, 22 pares de sapato, 72 gravatas e seis alfinetes de gravata de pérola e de brilhante.

Asfixiaram a cidade com a construção desses prédios. Toda a orla marítima. Naquele tempo o calçamento era feito no máximo por paralelepípedo. A cidade era arejada, pequena. Empurraram Vitória para o mar."

 

João Bonino Moreira, 67 anos. Bancário aposentado, criado no Centro e hoje residente na Praia do Canto.

 

"Fui criado na Graciano Neves. Era rua familiar, de classe média. O único problema é que entre os anos de 50 e 60, quando chovia, ficava intransitável.

Era muito agradável morar no Centro, existia todo tipo de casas de comércio e nós garotos passávamos o dia na rua jogando bola. E o colégio era perto, conhecido como escola de dona Tutu — famosa pelos bolinhos que dava nos alunos. Era extremamente severa, mas boníssima de coração. Da primeira à quarta série todos estudávamos juntos.

Na Costa Pereira fazíamos os nossos passeios quando rapazes. Rapazes no sentido horário, e moças em outro. Vinham cinco ou seis de braços dados, ombros se tocando, quando passávamos uns pelos outros havia a troca de olhares. O footing acontecia nos sábados e domingos, ao som de boleros, fox trot, mamo e rumba irradiado do prédio do Álvares, que ficava em frente.

Na Costa Pereira havia a sorveteria Mikey, que fazia o melhor sorvete que o dinheiro podia comprar. Era lugar para levar namorada. Depois foi aberto o Bobs, no início da Rua Sete de Setembro. Onde está o Bic Banco existiu o bar mais famoso de Vitória, dos senhores Laurindo e Barreira, portugueses. Onde está o Banco Bandeirantes havia a Sorveteira Pinguim, que tinha um salão de sinuca só freqüentado por rapazes. Onde hoje funciona o prédio do INSS, havia uma quadra de vôlei e basquete. Ali se enfrentavam o Álvares e o Saldanha. Todos iam.

Não sei se é porque eu era moço, mas era muito melhor aquela época. A gente não tinha dinheiro no bolso, mas mesmo andando na pendura dava para jogar, brincar, estudar, criar uma família decentemente."

 

Fonte: Centro de Vitória, Coleção Elmo Elton nº2 – PMV, 1999
Texto: Maria Cristina Dadalto
Fotos: Judas Tadeu Bianconi
Compilação: Walter de Aguiar Filho, agosto/2020

Especiais

A possível verdadeira história da tragédia da Vila Rubim - Adilson Vilaça

A possível verdadeira história da tragédia da Vila Rubim - Adilson Vilaça

Bernardino Realino pode ser invocado como protetor de certas categorias de cidadãos, que julgam poder contar com poucos santos

Pesquisa

Facebook

Leia Mais

Movimento Negro e Educação no ES - Por Gustavo Henrique Araújo Forde(12)

Nas últimas duas décadas do século XX, o Espírito Santo foi palco de uma efervescência política negra com a criação de um conjunto de organizações

Ver Artigo
Memória Capixaba o Arquivo e a Biblioteca - Por Gabriel Bittencourt

Florentino Avidos construiu o prédio destinado à Biblioteca e ao Arquivo Público, na rua Pedro Palácios

Ver Artigo
Viagem ao Espírito Santo (1888) - Princesa Teresa da Baviera (PARTE VI)

Um pouco mais tarde, ouvimos a voz exótica de uma saracura, isto é, de um raleiro que poderia ser uma Aramides chiricote Vieill

Ver Artigo
A possível verdadeira história da tragédia da Vila Rubim - Adilson Vilaça

Bernardino Realino pode ser invocado como protetor de certas categorias de cidadãos, que julgam poder contar com poucos santos

Ver Artigo
Bibliotecas - As 10 mais importantes

1) A Biblioteca Pública do Estado. Fundada em 16-6-1855, pelo Presidente da Província Dr. Sebastião Machado Nunes.

Ver Artigo