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O Minério de Ferro – Por Dermeval José Pimenta

Dermeval José Pimenta

Dotada de poderosas reservas de minério de ferro, de extensas florestas, de possantes quedas d’água, e situada a pouca distância do litoral e dos maiores centros consumidores do país, a região do Rio Doce está naturalmente indicada para ser, dentro em breve, uma das zonas de maior desenvolvimento econômico do Brasil.

Indubitavelmente, a Estrada de Ferro Vitória a Minas tem sido, desde o início de sua construção até o presente, o fator principal para o desbravamento e o povoamento desse ubérrimo Vale. A penetração dessa ferrovia, pela mata a dentro, inseparavelmente seguida pelo caudal do Rio Doce, representa um dos episódios mais heróicos da história das construções ferroviárias brasileiras. Milhares de seus obreiros foram sepultados no próprio leito da estrada, em construção, ou nas então recentemente abertas clareiras das matas virgens, vitimados pelas endemias, ou pelas desavenças, lutas e tragédias que se verificavam em um meio tão propício à violência e à incompreensão. A malária foi, no entanto, o mais grave e sério obstáculo encontrado. Era o terror dos que escavavam a terra para abrir estradas, e daqueles que se embrenhavam nas florestas para se apossarem de terrenos devolutos.

Para que o aproveitamento econômico dessa região seja o mais eficiente e influa mais marcadamente na economia nacional, devem ser resolvidos três problemas capitais: Saneamento, Transportes e Energia Elétrica.

Até 1940, foi extremamente lento o seu progresso. Nessa ocasião, as nações aliadas, empenhadas na guerra mundial, apelaram para o esforço de guerra brasileiro, no sentido de lhes serem fornecidos matérias primas, entre as quais se encontravam o minério de ferro, a madeira, a mica e o cristal.

O Vale do Rio Doce por tê-los, em abundância, mereceu uma atenção especial. Dois dos três problemas básicos foram então enfrentados, e ao mesmo tempo: o Saneamento e os Transportes. Sem que fossem resolvidos, inútil teria sido o esforço empregado para a obtenção dessas matérias primas.

Saneamento — Realmente grandioso foi o trabalho de saneamento empreendido pelo Serviço Especial de Saúde Pública, o SESP — a cargo de uma comissão mista de técnicos sanitaristas brasileiros e norte-americanos. A malária, que, anualmente, ceifava a vida dos que ali mourejavam, ou dos que por ali transitavam, está hoje considerada como praticamente extinta. As principais cidades, tais como Governador Valadares, Conselheiro Pena, Aimorés, Colatina e Fundão, foram saneadas e providas de instalações adequadas de serviços de água e esgoto. A obra sanitária empreendida pelo SESP é digna de apoio e de colaboração do nosso Governo que certamente continuará cooperando, afim de que os demais núcleos de população sejam também beneficiados com esses melhoramentos.

Transportes — Equacionado o problema dos transportes ferroviários pelo Governo Federal, foi ele entregue à Companhia Vale do Rio Doce, para solucioná-lo. As gigantescas obras que se vêm processando na remodelação do traçado da Estrada de Ferro Vitória a Minas, no reaparelhamento do seu material fixo e rodante, no reforço de suas pontes, na reconstrução de suas oficinas e na renovação dos seus métodos de operação, são patentes demonstrações de que, dentro em breve, será ela transformada em uma das mais modernas e eficientes ferrovias brasileiras.

É digno da admiração e do reconhecimento público o hercúleo e silencioso trabalho que se vem operando nessa estrada, que é a artéria vital por onde circulará a riqueza produzida, em toda aquela vasta área. E, por isso, justo é esperar que o futuro Governo da União se empenhará no sentido de que sejam concluídas as obras programadas, as quais são de grande importância para o nosso país e particularmente para os Estados de Minas e do Espírito Santo.

A influência da melhoria desses transportes ferroviários já se faz sentir no progressivo desenvolvimento das atividades agrícolas, industriais e comerciais dos municípios marginais à estrada.

Por mais rica, em potencial, que seja urna região, jamais poderá desenvolver-se, economicamente, se lhe faltarem meios adequados de transportes, para a movimentação das mercadorias e a circulação dos passageiros. E, ainda mais, é absolutamente indispensável que aqueles que empregam o seu capital e os seus esforços no fomento da produção, na criação da riqueza e no intercâmbio do comércio, não se desviem de suas atividades produtivas, à cata de meios de transportes para o escoamento dos seus produtos. Os transportes não lhes devem faltar, nos momentos precisos, mas, ao contrário, lhes devem ser oferecidos em todos os momentos que se tornem necessários.

O desenvolvimento econômico de uma vasta região mediterrânea, como é o Estado de Minas, depende essencialmente da eficiência dos seus meios de transportes e da orientação da política tarifária anotada pelas suas estradas de ferro. É nesses dois setores que a atuação dos Governos deverá se fazer sentir de maneira acentuadamente firme, aliada a uma permanente vigilância. E essa atuação firme e vigilante deverá ser exercida mais pronunciadamente quando se tratar de zonas tais como a do Rio Doce, ricamente dotadas de matérias primas. A administração estadual, como entidade que mais de perto sente, na economia do Estado, os maléficos efeitos de uma errônea política tarifária, deverá estar sempre presente e se fazer ouvir, em todas as ocasiões em que as empresas ferroviárias que cruzam o seu território estudem a modificação de suas tarifas. Estas não podem ser estabelecidas, levando-se em conta apenas as conveniências das próprias empresas ferroviárias ou dos clientes mais interessados, sem que sejam examinados os reflexos que advirão para a economia particular do Estado e para a economia geral do país.

Muitas vezes, parece de grande sabedoria a adoção de fretes de custo reduzido, afim de que se promova o transporte de matéria prima para grandes distâncias. Se, porém, tal critério é aplicado ao mesmo tempo em que se elevam, para aquelas mesmas distâncias, os fretes dos produtos de matéria prima beneficiada no próprio local onde é extraída, deverá o mesmo ser condenado e intransigentemente combatido, porque é prejudicial à economia da estrada, à economia da região e à própria economia nacional. Essa é a política tarifária denominada colonial — que facilita a exportação de matéria prima e dificulta o seu beneficiamento nas proximidades do local onde é extraída.

Felizmente, essa política tarifária, nociva aos interesses da economia dos Estados produtores de matéria prima, não tem sido aplicada no Rio Doce. O contrário é o que se verifica. Se a madeira em tora encontra facilidades para transportes a grande, distância, a madeira beneficiada, por sua vez, recebe um tratamento tarifário especial, e os baixos fretes a ela aplicados, estimulam a instalação de serrarias, ao longo da linha. É assim que existem cerca de cinqüenta serrarias, entre Vitória e Nova Era, desdobrando toras e exportando madeira beneficiada. Todos se beneficiam: a estrada, as serrarias, os consumidores e as localidades em que estão instaladas.

O mesmo critério está sendo aplicado ao minério de ferro, afim de que os altos fornos, produtores do ferro guza, se instalem nas proximidades das jazidas, evitando o transporte desnecessário de grande massa de minério a distâncias consideráveis e por um preço deficitário.

É oportuno referir-nos, também à questão do transporte do gado. Essa é uma zona privilegiada para a pecuária. O transporte ferroviário dos bovinos deverá ser facilitado, afim de que o gado não só desta zona, mas de todo o nordeste, alcance os centros consumidores. De acordo com a mesma ordem de idéias acima expedidas, frigoríficos e charqueadas que se estabelecessem ao longo da linha férrea merecerão atenção tarifária especial, em relação à tarifa de gado em pé.

Quanto aos transportes rodoviários, são também indispensáveis ao desenvolvimento da região.

O lançamento da rodovia Rio-Baía, cortando transversalmente o vale em grande extensão, veio abrir novas perspectivas econômicas para essa zona privilegiada, oferecendo-lhe meios rápidos de transporte para o intercâmbio de passageiros e de mercadorias com as zonas Norte e Sul do país.

A construção de estradas de rodagem regionais destinadas a completar os meios de transporte dessa região, deverá merecer toda a atenção dos Governos de Minas e do Espírito Santo, salientando-se, em primeiro plano, aqueles que venham ligar as estações ferroviárias aos municípios adjacentes. A própria potamografia indica o sentido dessas rodovias regionais. Deverão seguir o vale dos afluentes do Rio Doce quer partindo das estações ferroviárias, quer se originando das linhas-tronco rodoviárias federais ou estaduais. Novas pontes deverão ser lançadas sobre o Rio Doce e sobre os seus afluentes, de modo que sejam integradas na economia dessa região, zonas que, embora delas próximas geograficamente, ainda não tributárias forçadas de longínquas cidades, às quais estão ligadas pela facilidade dos transportes.

Torna-se mais simples a execução desse plano de vez que um dos objetivos do Governo Federal, através da Companhia Vale do Rio Doce, é o de promover o desenvolvimento dessa região; e, assim sendo, uma estreita colaboração deverá se fazer entre todas essas entidades interessadas.

Energia Elétrica — Esse terceiro e básico problema ainda não foi solucionado, apesar da existência de um grande potencial hidroelétrico.

No presente momento, estão sendo captados cerca de 200.000HP, sendo 140.000 no Rio Santo Antonio, a cargo do Estado de Minas; 20.000 no Rio Piracicaba, pela Belgo Mineira; e 40.000 no mesmo rio, pela Cia. Aços Especiais de Itabira (Acesita). É um grande contingente destinado ao seu desenvolvimento industrial. Entretanto, florescentes cidades, entre as quais está a de Governador Valadares, ainda não foram dotadas de energia suficiente à sua expansão industrial. A solução deste problema deve competir ao Estado, em que estão situadas essas localidades, futuros empórios industriais.

O Estado de Minas está construindo as obras de captação do Santo Antonio e certamente promoverá a construção de outras usinas que, mais particularmente, satisfaçam aos anseios de cidades deste Vale.

SIDERURGIA

A implantação da siderurgia nacional no Vale do Rio Doce tem sido um sonho longamente acariciado por todos os mineiros, remontando-se, mesmo, à época colonial. No começo do século passado quando o Governo Português, pela primeira vez nomeou um brasileiro, para ser o administrador geral dos Terrenos Diamantinos, a primeira preocupação deste foi construir uma fábrica de ferro, para que os serviços de mineração de diamantes e de ouro fossem suficientemente abastecidos de ferramentas, até então importadas da Europa, a elevado preço. Esse homem de grande visão patriótica, o dinâmico Intendente Câmara Bittencourt, localizou a sua usina exatamente no altiplano deste Vale, na costa oriental da Serra do Espinhaço, onde está situada a Vila do Morro do Pilar, cujas águas correm para o Rio Santo Antonio, afluente do Rio Doce. Em 1814, verificou-se a primeira corrida do ferro guza no Brasil, e a primazia coube a essa Usina e, portanto, a esta região.

Em época mais recente, uma outra Usina, situada em Monlevade, pertencente à Belgo Mineira, mas já dotada de instalações e aparelhamentos modernos, obteve a honra de, com o aço de sua própria produção, laminar os primeiros trilhos no Brasil.

Com essas credenciais, era justo que tivesse a pretensão de se tornar o parque da indústria siderúrgica nacional.

Se, em 1940, as condições do Vale do Rio Doce não foram ainda julgadas satisfatórias para que ali fosse localizada a primeira Usina Oficial da Grande Siderurgia Nacional, foram-lhe, contudo, concedidos meios para que, em pouco tempo, ficassem preenchidos os requisitos indispensáveis à consecução daquele desiderato.

O Vale está agora, praticamente, saneado, a estrada de ferro se acha em remodelação, os transportes já se fazem de maneira eficiente. O minério de ferro, diariamente, desce em composições de grande tonelagem. Há abundância de florestas para a extração da madeira e do carvão vegetal. Há um porto em aparelhamento. Há estradas de ferro e de rodagem ligando-o diretamente aos nossos maiores centros consumidores. A energia elétrica está sendo captada. É chegado, pois, o momento da ação. São indispensáveis, no entanto, a congregação de esforços e a colaboração de todos os interessados na solução desta questão de elevado interesse nacional.

Por ser uma fonte de abastecimento de moeda estrangeira para o nosso país, a exportação do minério de ferro deve ser estimulada e facilitada. Essa exportação, no que se refere ao minério de Itabira, saído pelo porto de Vitória, atingirá, no corrente ano, 750.000 toneladas, com a produção de US$ 6.300.000,00. No próximo ano, será de 1.500.000 toneladas e as divisas produzidas serão de US$12.600.000,00, ou seja, Cr$ 246.000.000,00. Se essa exportação é conveniente à economia nacional, ainda mais o será quando entrosada com a indústria siderúrgica brasileira. No que tange à economia do Estado de Minas Gerais, o seu maior interesse reside precisamente no setor siderúrgico e na localização dessa grande indústria no seu território. Basta observar-se o desenvolvimento que se vem operando em Monlevade e, sobretudo, em Volta Redonda e seus arredores, para se aquilatar do grão de importância que tal localização representa para o Estado.

Dentro em breve, será construído, junto ao Cais de Minério, no Porto de Vitória, um cais especial, com aparelhagem moderna, para o rápido desembarque do carvão mineral e do coque importado, e o seu rápido carregamento nos vagões ferroviários. Esse combustível chegará aos fornos das Usinas, a preço reduzido, visto como será transportado, em retorno, nos navios que exportarem o minério e nos próprios vagões ferroviários que transportarem esse minério até o porto.

Se é certo que ainda não foi resolvida a questão do fornecimento de energia elétrica a esta região, contudo está ela em vias de solução. Não há outra zona, no nosso país, por mais próxima que seja dos seus maiores centros consumidores, que com ela se equipare. Nenhuma delas reúne um conjunto de condições tão favoráveis, quanto à facilidade e segurança de transporte, e quanto à obtenção, a preço reduzido, destas matérias primas indispensáveis: o minério de ferro e o cóque metalúrgico.

Nestas condições, se houver decisiva conjugação de esforços entre o Governo Federal e os Governos dos Estados de Minas e do Espírito Santo e bem assim uma estreita colaboração com a Companhia Vale do Rio Doce, essa maravilhosa região, dentro em breve, realizará a sua secular aspiração — de se transformar no grande parque da siderurgia do Brasil.

Minas Gerais que, no momento, se encontra em precária situação financeira e com a sua economia francamente depauperada, volta as suas vistas e as suas esperanças para esse Vale, na certeza de que, cooperando com o Governo Federal e com as empresas que ali estão empregando ou venham empregar suas atividades, encontrará uma nova fonte de energia criadora de novas riquezas.

Nessa região que o Brasil deposita suas esperanças. Eu concito a todos, portanto, a que congreguemos os nossos esforços, a que trabalhemos sem desfalecimento, até que consigamos realizar esse sonho e essa aspiração de Minas Gerais, afim de que ela, com a sua economia restaurada, volte a brilhar ainda com maior luminosidade no cenário da política, da administração e da economia nacionais.

 

Conseguida a realização desse sonho tão longamente acariciado, por aquele Estado, o Brasil dará mais um passo decisivo na redenção da sua economia e sobretudo na consolidação definitiva da sua indústria siderúrgica, alicerce básico da defesa e segurança nacionais.

 

Fonte: Introdução do Livro -  O Minério de Ferro na Economia Nacional (O Vale do Rio Doce), 1950
Autor: Dermeval José Pimenta, Engenheiro de Minas e Civil - Presidente da Companhia Vale do Rio Doce
Compilação: Walter de Aguiar Filho, fevereiro/2015 

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