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O Norte do Espírito Santo – Por Mário Freire

Ponte da passagem

Descrevendo o Espírito Santo, como apreciado por Saint-Hilaire e pelo Príncipe Maximiliano, pouco antes da Independência, continuemos a reproduzir algumas observações que anotaram.

Prosseguindo a viagem para o norte, um e outro atravessaram, com pequeno intervalo, a ponte da Passagem. Construída com o nome de Ponte de Maruípe em 1799 ou 1800, Saint-Hilaire já a encontrou em mau estado.

O Príncipe de Neuwied, depois de estar na povoação da Praia-Mole e no povoado de Carapebuçu, chegou a Nova-Almeida. Saint-Hilaire alongou a viagem pela Serra, depois de passar por Ponta dos Fachos. Era a época das grandes "queimadas", que o botânico deplora. Subiu ao Mestre-Alvaro, denominação que, assim registrada em 1587, o Governador Rubim pretendera transformar em alvo, baliza.

Como a Serra, prosperavam Carapina e Caraípe ou Carapebuçu, antes de chegar à Vila de Nova-Almeida.

No Convento dos Reis Magos, o Príncipe Maximiliano ainda viu livros dos antigos jesuítas. Além de culturas do milho e mandioca, assim como da exportação de lenha, o Príncipe observou a pesca com galhos macerados de tingui, que entorpecia os peixes, apanhados a mão. Saint-Hilaire descreveu a longa praça, à frente da igreja e, entre as casas, pequenos oratórios, que, por ocasião da prática devota das vias-sacras, na quaresma, serviam de "estações".

Os membros da Câmara, o capitão-mór e um dos juízes ordinários eram índios civilizados. Como limites do distrito, respeitavam-se os da sesmaria concedida, em 1610, aos indígenas aldeados nesse ponto.

No caminho para Aldeia-Velha, ulteriormente Santa-Cruz, ficavam os lugares Frecheiras e Capúba.

De Aldeia-Velha ainda se exportava tatagiba — um pau amarelo, próprio para tinturaria.Outro grande comércio local era o de cal de marisco, negociada a 4$000 por 50 alqueires (10 hectolitros), e vendida depois, em Vitória, por 8$000, que Saint-Hilaire calculou equivalerem a 80 francos. Notou, porém, o alqueire diferente do que se admitia no Rio, onde essa medida tinha 40 litros.

As tábuas apropriadas para marcenaria, com 20 a 25 palmos, por um de largura, custavam pataca e meia; as de madeira ordinária, meia pataca (um franco).

O posto militar era servido por índios, que se revezavam.

O distrito abrangia ainda a povoação de Piraqueaçu, a que também se dava o nome de Destacamento, com uns sessenta casebres de índios.

Os dois cientistas estiveram em vários "quartéis" do rio Doce: de Riacho, próximo a um lugarejo conhecido como Campos de Riacho; e de Regência, onde Neuwied examinou um tronco, assim como a tábua de suplício, que mantinha a vítima presa pelo pescoço através de um dos orifícios. Viu também os "gibões" de couro para defesa dos soldados, experimentou-lhes a resistência a tiros, e desenhou-os em uma estampa de sua conhecida obra. A travessia do rio custava 160 réis, por pessoa; e outro tanto pelo cavalo. Os burros da expedição de Saint-Hilaire foram objeto de curiosidade, porque, no Espírito Santo, os transportes eram feitos em cavalos, preferidos, geralmente, em todo o norte, ao passo que as bestas eram mais aproveitadas no interior.

Havia ainda outros "quartéis". Em Linhares — dois: do Aguiar, quase na altura dessa povoação, e de Comboios; no alto rio Doce, o do Souza.

Julgando impossíveis quaisquer comunicações terrestres com o norte, antes do estabelecimento dos "quartéis", louvável iniciativa de Silva Pontes, Saint-Hiliare ainda ouviu referências à crueldade desse Governador, o que ele preferiu classificar de "bizarrias".

Na subida para Linhares ficava a próspera fazenda de Antônio Martins; doze pessoas viviam satisfeitas em uma propriedade que não tinha mais de 3 quartas de terra. Em frente à povoação, outro atestado da fertilidade da região, a admirável fazenda Bom Jardim, de João Calmon, hoje Estação Experimental de Goitacases. Tinha engenho de açúcar e olaria. Saint-Hilaire confirmou as perseguições feitas pelo Governador a esse adiantado agricultor, que, como referiu o Padre Marcelino Duarte, viu-se obrigado a queixar-se pessoalmente ao Rei.

Linhares tinha, segundo Rubim, um cirurgião e medicamentos. Saint-Hilaire viu a igreja, quase concluída. Um e outro cientista visitaram a grande e majestosa lagoa Juparanã ou, segundo Rubim, Giparanã.

 

Fonte: A Capitania do Espírito Santo, ano 1945
Autor: Mário Aristides Freire
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2015

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