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Centenário do bonde de Vila Velha (1912 - 2012)

Bonde, 2012

Vitória a Capital, após breve período de ter linha de bonde puxada a burro, e depois eletrificada, impulsionou o surgimento da reivindicação de dotar Vila Velha de linha de bonde, para facilitar o acesso que continuava sendo feito por pequenas embarcações da Prainha ou de Argolas para o Centro de Vitória.

No início do século XX o automobilismo estava chegando, mas as 5 Pontes só viriam ficar prontas em 1928 no final da gestão do Presidente do Estado Florentino Avidos (quando abriu a estrada velha de rodagem para Vila Velha partindo de São Torquato, e audaciosamente indo a estrada de terra até o Campinho do Convento da Penha ).

Então o Governo do Estado conseguiu que a Assembléia Legislativa votasse uma lei em 1905 para que por meio de uma concorrência, desse concessão a um empresário para explorar a linha de bonde para Vila Velha, que construísse.

Nos relatórios governamentais, temos:

Autorisado pela Lei n° 428 de 14 de novembro do ano passado, concedi à Antenor Guimarães o uso e goso de uma modesta via férrea que, partindo do Porto de Argolas vá terminar na pitoresca cidade do Espirito Santo.

Com grande satisfação vos comunico que o capital necessário para a construção dessa estradinha foi facilmente coberto e que a construção em breve principiará.

Estando esta Capital fadada para ser o empório de grande comercio e não podendo alargar-se pelas suas condições topográficas, devem ser bem recebidos os empreendimentos que facilitem os meios de podermos contar com suburbios em condições salutares e de vasta extensão. Estes serão seguramente Vila Velha e Suá.“

Mensagem do Presidente do Estado do Espirito Santo – Coronel Henrique da Silva Coutinho – 1905 – Victoria – Papelaria e Typographia Nelson Costa e Comp. – 11.9.1905

“A estradinha de ferro de Vila Velha, de futuro risonho, ainda não pôde iniciar sua construcção, porque nem todos os acionistas têm acudido às chamadas da 1ª prestação. Continuam entretanto animados os empresários.”

Relatório do Coronel Henrique Silva Coutinho – Presidente do Estado do Espírito Santo – 9.10.1906- Victoria Papelaria & Typographia Nelson Costa & Cia

Pelo que se despreende a obra só deve ter iniciada em 1907, e veio a ser concluída com muita dificuldade em 1912, sendo que temos a ata da inauguração que o foi na gestão do Presidente Jerônimo de Souza Monteiro.

Esse festejo ocorreu em 12 de abril de 1912 em Aribiri na estação que lá foi construída, nessa época era Prefeito Municipal de Vila Velha José Pinto de Queiroz Jr.

Tudo indica que a linha iniciou em Paul e não em Argolas, e logo à frente teve de fazer um corte em Garrido depois da rampa de Vila Batista.

Tiveram que transpor dois braços de mar do Rio Aribiri, na ilha da Conceição para chegar em Ataíde, por meio de pontes.

Na entrada de Aribiri, perto da pracinha e da capela, construíram uma estação, que tinha anexa uma casa de força, tanto para gerar energia em corrente contínua, como para retificar corrente alternada em contínua.

Vila Velha havia recebido energia elétrica por essa época. Fora inaugurada em 30.7.1910 quando era Prefeito em exercício o então Major da Guarda Nacional, depois Coronel, o Sr Joaquim da Cunha Vieira Mascarenhas.

No campinho do Aribiri tiveram que fazer um aterro, e o mesmo na região da Glória, e foram até a Prainha de Vila Velha, com ponto final onde surgiu o bar Piratininga e o Armazém de Antonio Quintaes e de Antonio Queiroz (de Eugênio Queiroz ) por detrás da Matriz do Rosário onde ainda havia um cemitério antigo.

A extensão até o quartel de exército que surgiu em Piratininga, foi construída já algumas décadas depois.

Na Jaburuna pra transpor um córrego chegaram construir uma pequena pontezinha, tipo pontilhão de pequena proporção. Esse córrego quando chove muito ressurge e inunda casas e ruas situadas na sua bacia a montante desse ponto.

Consta que havia dificuldade de conseguir turmas de trabalhadores habituados a construir linha férrea, e chegaram utilizar operários trazidos da Índia, e no meio dele estava o Hilário Indiano que acabou ficando a residir em Vila Velha. Por certo devem ter sido contratados das obras da ferrovia da Madeira Mamoré em Rondônia ou das do Canal do Panamá, ambas em construção na época.

A linha de bonde tinha o leito de terra, os dormentes de madeira, e a bitola era de um metro. A extensão da Prainha até Paúl era de aproximadamente 8 kilômetros.

A linha de bonde entrando em Vila Velha pela Av. Jerônimo Monteiro e pela rua Luciano das Neves, estimulou o crescimento da cidade para esses logradouros, o que aumentou a população, sendo que surgiram casas ao longo da estrada de ferro até Paul.

A linha de bonde foi muitíssima utilizada pela população de Vila Velha. Aos sábados chegava a ter cada carro um reboque, e o mesmo ocorria na época da Festa da Penha.

A linha de bonde passou por vários proprietários, tendo certa feita a Câmara Municipal de Vila Velha autorizado a venda da participação da Prefeitura no empreendimento para uma empresa canadense que passara a administrar o sistema elétrico tanto da Capital como de Vila Velha.

Quando surgiu o IBES em 1951, seus moradores chegaram reivindicar uma extensão de linha até lá.

Havia a linha de Piratininga, que ia até Paul e vice versa, e outra que ia de Aribiri a Paul e retornava. Em Aribiri a linha tinha uma oficina, e um pátio para possibilitar o cruzamento dos bondes.

Na Prainha havia um pequeno pátio com uma chave, para ali ser deixado algum reboque ou mesmo bonde com avaria para não impedir passagem de carro que seguisse para o quartel.

O bonde funcionava desde a manhazinha até por volta de 10 horas da noite, e passou a ter grande concorrente com o asfaltamento da rodovia Carlos Lindenberg inaugurado em 8.9.1951.

Por volta de 1955 o Governo do Estado chegou estudar transformar a Prainha de Vila Velha num porto moderno, por ficar perto da barra, o que baratearia o frete e o custo com a praticagem, e justamente a linha de bonde seria então reformada para receber trens que iriam de Argolas até ali para atender aos navios. Na Prainha só havia o cais “dos padres” e o de “dona Celeste!”.

Chegaram a fazer batimetria da enseada da Prainha, que acabou sendo parcialmente aterrada, a partir de outubro de 1960 quando de sua primeira grande mutilação.

Como a linha da Leopoldina e a da Vitória a Minas eram de bitola de um metro, coincidindo com a da linha do bonde, o gabarito da estrada já facilitava seu aproveitamento para transporte de carga.

Caso o fato tivesse se concretizado há muito as belezas naturais e históricas da Prainha teriam sido destruídas.

A travessia de Paul para o Centro de Vitória, já no Governo de Florentino Avidos eram feito por duas lanchas construídas e importadas da Inglaterra, de casco de madeira, com motor de centro. Eram belíssimas, e infelizmente após a desativação da linha de bonde tiveram fim inglório.

Em meados dos anos 60 do século XX, o sistema de bonde foi entregue para a PMVV pois não tinha rentabilidade que interessava à companhia de eletricidade, que há muito vinha fazendo uma manutenção muito deficiente no sistema, sendo que o leito ainda era de terra o que facilitava o apodrecimento dos dormentes, e a ocorrência de descarrilamentos.

A tripulação dos bondes era confiada a três funcionários treinados: o motorneiro que ia lá na frente operando as chaves e os freios; o cobrador que percorria o bonde cobrando as passagens dos passageiros, e o condutor, que ficava lá atrás fiscalizando e ainda autorizando as partidas e as paradas acionando uma campainha; enfim chefiando as viagens.

Pelo regulamento havia a curiosa proibição de não transportar maltrapilhos, e que ninguém podia transitar nos estribos. Quanto a isso não houve como conseguir que esse fator de segurança fosse respeitado.

Como o bonde era aberto, a evasão de receita era facilitada, e a administração só colocava elementos de extrema confiança como cobrador e condutor. Mas os motorneiros (tive relato muitos anos depois) sempre desconfiavam desses dois como a população, ou seja eram mal vistos como os moleiros, a semelhança de algo que acontecia desde a remota antiguidade...

 A erradicação dos bondes vinha sendo moda nas grandes cidades do país, e chegou primeiro em Vitória, na Administração do antigo Prefeito Solon Borges Marques. Quando veio ser Prefeito em Vila Velha, tomou a mesma iniciativa com a linha de bonde daqui no ano de 1972, ou seja no sexagenário do sistema !

A linha de bonde foi transformada na “Estrada” Jerônimo Monteiro, e um único carro que remanesceu está de posse da Escelsa EDP. A estação de Aribiri ficou por um tempo com a PMVV que ali colocou uma oficina e uma fábrica de manilhas, e depois foi demolida e vendida a área, surgindo uma casa comercial. Uma pena.

 

 

Roberto Brochado Abreu, março/2012
Membro da Casa de Memória de Vila Velha
Compilação: Walter de Aguiar Filho, setembro/2012 



GALERIA:

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Bonde

O Bondinho de Cachoeiro

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