A reação nacionalista (História da Vale)
O poder monopolista conquistado pela Itabira com a assinatura do contrato provocou uma escalada da oposição nacionalista. Após ser firmado, o contrato, obedecendo aos preceitos vigentes, foi enviado ao Tribunal de Contas da União, que se recusou a registrá-lo, alegando desrespeito às normas legislativas. Epitácio Pessoa pressionou o tribunal e o contrato acabou sendo registrado sob protestos. Mas a intervenção de Pessoa tornou necessária a devolução do contrato para aprovação do Congresso Nacional, onde foi examinado por diversas comissões, sem que se chegasse a uma conclusão definitiva sobre sua validade.
Os planos de Farquhar atingiam numerosos interesses. Os proprietários das pequenas metalúrgicas de Minas Gerais temiam que a exclusividade pretendida pela Itabira Iron Ore Co. sufocasse seus empreendimentos. As companhias estrangeiras, que haviam comprado extensas áreas para a extração do minério de ferro, também se mostravam apreensivas quanto à exclusividade dos meios de transporte alcançada por Farquhar. As empresas carboníferas do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina temiam a concorrência do carvão de pedra estrangeiro, que chegaria ao Brasil nos navios da Itabira. O projeto ainda uniu contra si todos os fornecedores de máquinas e ferragens alemães, ingleses, franceses e norte-americanos, que receavam a concorrência da siderúrgica a ser instalada pela Itabira quanto ao fornecimento do aço.
Minas Gerais, por ser o estado onde se encontravam as maiores jazidas, tornou-se o reduto de resistência a Farquhar e aos políticos que a ele se aliaram. Ao assinar o segundo contrato, Arthur Bernardes, sob a pressão de ter que ratificar aquele já firmado pela Itabira Iron Ore Co. com o Governo Federal, promulgou, em 21 de setembro de 1920, a Lei no 793. Ela reafirmava os termos da Lei no 750 e condicionava a exportação do minério de ferro à instalação no estado, pela Itabira, de uma usina com capacidade para produzir, no mínimo, 150 mil toneladas anuais de produtos siderúrgicos. Além disso, o decreto ampliou de 20 para 30 anos a vigência das vantagens fiscais para quem produzisse aço.
No âmbito do Governo Federal, os ventos também começaram a soprar desfavoravelmente para a Itabira após a saída de Epitácio Pessoa da Presidência da República. Seu sucessor foi o próprio Arthur Bernardes, que, assumindo o poder em março de 1922, procurou oferecer uma alternativa nacionalista ao projeto da companhia estrangeira. Para isso, designou uma comissão, formada por parlamentares, técnicos e industriais, que, em 1923, apresentou o primeiro esboço de um plano siderúrgico nacional. À frente dos trabalhos estava seu braço direito e ex-secretário Clodomiro de Oliveira.
O trabalho da comissão forneceu as bases para o Decreto no 4.801, promulgado em 9 de janeiro de 1924. Confirmando a orientação nacionalista do governo Bernardes, o decreto previa a concessão de empréstimos, pela União, exclusivamente às empresas nacionais organizadas com o objetivo de instalar usinas. Essa orientação iria se acentuar ainda mais na reforma constitucional levada a cabo por Bernardes em 1926, proibindo a transferência, a estrangeiros, das minas e jazidas necessárias à segurança e defesa do país.
Em Minas Gerais, a política adotada por Arthur Bernardes no tocante à extração mineral e, sobretudo, à Itabira Iron Ore Co. foi seguida à risca por seu sucessor na presidência do estado, Raul Soares (1922-1924), e pelo sucessor deste, Fernando de Melo Viana (1924-1926). O impasse criado para a assinatura do contrato estadual com a Itabira só seria superado na administração de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada (1926-1930). Em 7 de dezembro de 1927, foi finalmente celebrado o segundo contrato, pelo qual a Itabira Iron Ore Co. só poderia começar a exportar minério de ferro quando entrasse em funcionamento uma indústria siderúrgica.
Na tentativa de viabilizar a aprovação dos projetos da empresa e de aplacar os violentos ataques aos aspectos monopolísticos do seu contrato, o presidente do Estado de Minas Gerais, Antônio Carlos, condicionou a aprovação dos planos da Itabira à retirada do mono-pólio sobre os transportes da Estrada de Ferro Vitória a Minas, assegurada pelo contrato de 1920. Assim, em 10 de novembro de 1928, a Itabira assinou um termo de renúncia, pelo qual não só desistia de transportar exclusivamente seus minérios, concordando em transportar minérios pertencentes a terceiros, como também aceitava transportar passageiros e escoar a produção agrícola da região por onde passariam suas linhas.
A assinatura do termo de renúncia abriu caminho para a promulgação, dois dias depois, do Decreto Federal no 5.568, que atestava a legalização do contrato pelo Congresso Nacional, e do Decreto Estadual no 8.045, de 8 de dezembro de 1928, pelo qual o governo mineiro autorizava a Itabira a iniciar suas atividades.
Em setembro de 1930, a Itabira obteve, mais uma vez, a dispensa da construção da usina, aproveitando-se do descontentamento e da força política dos pequenos fabricantes de ferro-gusa, temerosos com a possibilidade de a empresa instalar uma siderúrgica.
Devidamente legalizada para desenvolver seus planos no Brasil, a Itabira buscou financiamento junto a bancos europeus e norte-americanos. Entretanto, a crise econômica mundial de 1929 e a subsequente retração dos mercados financeiros, aliadas às transformações políticas e institucionais trazidas pela Revolução de 1930, abriram uma nova etapa na luta da Itabira Iron Ore Co. para a implantação de seus projetos.
Fonte: Vale 70 anos: Nossa História, 2012
Compilação: Walter de Aguiar Filho, junho/2013
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