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Ano de 1550 – Por Basílio Daemon

Cais dos Padres e Alfandega, 1910

[1550].(38) Neste ano desinteligenciam-se o donatário Vasco Fernandes Coutinho e Duarte de Lemos, em razão deste último querer que a sua doação da ilha do seu nome fosse ampla, e Vasco Coutinho haver declarado que esta doação era limitada à sua própria fazenda, que se achava assentada no local onde hoje se vê a igreja de Santa Luzia, servindo esta capela para as orações dos moradores, havendo casa de moradia unida à capela e uma engenhoca abaixo; a este lugar que abrangia um grande perímetro a leste e a norte, indo até o Campinho ao lado de oeste, é que se deu por muito tempo o nome de Roças Velhas, que também foi dado a uma fazenda com engenho de açúcar e aguardente na freguesia de Cariacica, que depois pertenceu aos jesuítas, e de que se pagava de foro um pão de açúcar de quatro libras. O certo é que contrariado Duarte de Lemos pela declaração de Vasco Coutinho, e pelas intrigas que formigaram entre os dois lados, Duarte de Lemos escreveu a el-rei D. João III, em data de 14 de julho deste ano,(39) comunicando que Vasco Coutinho quando partiu pela primeira vez de Portugal para esta então capitania do Espírito Santo, tinha o propósito formado de tornar-se independente como um grande potentado, o que não pôde conseguir nem levar a efeito pelas infelicidades e contrariedades por que passou, cujo propósito fora comunicado ao mesmo Duarte de Lemos por Vasco Coutinho, e a Fernão Willas e outros. Esta carta de Duarte de Lemos prova ainda a ida de Vasco Coutinho a Portugal, pois ele o diz: quando partiu a primeira vez. Por estes motivos Duarte de Lemos deliberou-se a ir para a Bahia, visto ser considerada a doação como um solarengue; e, ou porque pedisse, ou porque conviesse à Corte portuguesa, o certo é que foi mandado como capitão para a donataria de Porto Seguro, por já ali não existir Pero do Campo.

Idem. Neste ano é aberto nesta então capitania o comércio direto com Portugal e Angola, por instâncias feitas daqui e talvez promovidas pelo mesmo donatário quando lá esteve, o fato é que nesse ano foi estabelecida uma espécie de armazém alfandegado na vila do Espírito Santo,(40) sob vigilância de Belchior de Azeredo Coutinho Velho, que já morava na capitania, o qual foi nomeado provedor da Fazenda Real e dos defuntos e ausentes, e promovido mais tarde, por alvará de 20 de outubro de 1556, a cavalheiro fidalgo com todas as regalias que lhe dava escudo e armas assim como seu capitão-mor. Esta espécie de Alfândega, pelas investigações que fizemos, e como adiante se verá, no século XVII parece-nos ter sido estabelecida no local em que existe a casa de propriedade do Sr. Firmino de Almeida Silva, à beira-mar, e onde há indícios que isso atestam.(41)

 

Notas do Autor

38 Aqui o autor juntou dois eventos diferentes em um mesmo ano. Os desentendimentos entre Coutinho e Duarte de Lemos ocorreram antes mesmo de agosto de 1540, quando os dois se apresentaram em Lisboa diante do notário geral da Corte para a oficialização da doação através de escritura na qual o donatário redefiniu a área concedida. [Oliveira, HEES, p. 43-4] No entanto a data da carta de Lemos é realmente 1550, pois ele teria sido mandado a Porto Seguro nesse ano por Tomé de Souza, assumindo o posto de capitão por quatro anos. [Oliveira, HEES, p. 45]

39 Carta de Duarte de Lemos a el-Rei, de Porto Seguro, 14 de julho de 1550.

40 “...onde houve em outro tempo uma alfândega, por motivo do comércio, que sustentava diretamente com a Europa e África.” [Pizarro, Memórias, II, p. 15]

41 (a) Registre-se aqui, por sua importância, o fato de que “Naquele ano [1550], Antônio de Barros, provedor-mor; Pero de Góis, capitão-mor do mar; e Pedro Borges, ouvidor geral, tinham vindo correr as capitanias do sul, por ordem [?] de Tomé de Souza. A vinte e seis de fevereiro, ‘nesta vila do Espírito Santo’...” [DH, XXXV, 62, apud Oliveira, HEES, p. 66, nota 13]. (b) “Fui ter ao Espírito Santo terra de Vasco Fernandez Coutinho [...] estive aqui cinco ou seis dias por a terra estar quase perdida com discórdias e desvarios dos homens por não estar Vasco Fernandes nela e ser ido não sei se lá se onde, saiu o ouvidor fora consertou tudo.” [Carta de Pero de Góis, vinte e nove de abril de 1551, Corpo Cronoló - gico, Parte I, maço 92, nº 113, apud Oliveira Lima, Nova Lusitânia (Apêndice), 322-3, e Oliveira, HEES, p. 71] E é provável que também em 1550 Coutinho tenha viajado para a capitania de Porto Seguro e daí para Portugal: “Senhor, V. A. saberá como Vasco Fernandes Coutinho veio ter a este Porto Seguro e foi surgir junto da nau a Santa Cruz fazenda do duque de Aveiro que é desta vila duas léguas onde estava a nau de V. A. […] dizendo que se queria ir nela ao reino…” [Carta de Duarte de Lemos a el-rei, de Porto Seguro, 14 de julho de 1550].

 

Nota do Compilador sobre a foto ilustrativa

Na construção que aparece na foto de 1910, localizada de frente para o pórtico do Convento da Penha, alí certamente também funcionou uma alfândega, tendo em vista o antigo Cais dos Padres anexo a esta construção e a existência até hoje de uma abertura no muro de pedra da subida do Convento da Penha, pelo lado direito interno do pórtico, como se fosse um acesso privativo à alfândega.   

 

Nota: 1ª edição do livro foi publicada em 1879
Fonte: Província do Espírito Santo - 2ª edição, SECULT/2010
Autor: Basílio Carvalho Daemon
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2019

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