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Lembranças de O Diário – Por Plínio Martins Marchini

Capa do Livro: O Diário da Rua Sete – 40 versões de uma paixão, 1998 - Capa: Anderson Marques

Minha primeira tentação é garimpar episódios antigos, mas eles se formam como as nuvens tocadas pelo vento: mudam de formas, juntam-se, misturam-se, esbatem-se a uma rajada mais forte. Tento pegar os fiapos que escapam, mas até minha memória traiu o passado. Não há mais episódios a reviver, apenas a consciência de uma época morta.

Difícil explicar. Sei de coisas engraçadas, tristes e heróicas, mas estão emparedadas, como inúteis, duras e irremovíveis atrás de anos e anos de entulho. Não posso sacá-las como valores confiados a um banco, pois saem fragmentadas, talvez ainda gratas como lembranças, mas inúteis como depoimento.

Os jornalistas de minha geração guardam alguns orgulhos profissionais. Somos bastante antigos. Como pesadas tartarugas que deixam na praia a marca do seu arrastar sofrido, há sulcos atrás de nós. E essas marcas se confundem com as que deixou nesses vinte e um anos, o próprio O DIÁRIO.

Velho O DIÁRIO de jornalismo político. Aqui construímos nossa glória de papelão. Solene inutilidade derramada de editoriais gongóricos para ser destripada nas ruas pelas multidões fanatizadas. Aqui glorificávamos os amigos e aliados, despojados de todos os seus defeitos. Aqui deitávamos por terra, em bordoadas bem adjetivadas, os adversários deserdados de qualquer qualidade humana.

Mais tarde tudo mudou. Os jornais deixaram a água furtada da política e acompanharam a evolução dos tempos. Depois de servir docilmente aos políticos, minha geração alterou a rotação desse mundo. Sem que os próprios donos percebessem, os jornais marcharam para diante. Fizeram algumas conquistas importantes, como a independência de notícia. Este é ainda um instrumento imperfeito, mas é bom lembrar que anos atrás o jornal do Governo não dava notícia de Oposição - e vice-versa. Se hoje ainda existe limitação ao primado da notícia, é bem menor e bem menos sentida pelo leitor.

O DIÁRIO representou sempre a vanguarda de muitas mudanças. Mesmo no seu início de vida, quem se plantou aqui para falar em nome de pessedismo conservador foi uma ala renovadora, pouco compromissada com que se poderia chamar "o espírito da época".

Depois, nas mãos da Oposição, Manteve-se aberto a novas técnicas e idéias, sujeitando-se a períodos de experiências arrojadas e - cumpre confessá-lo modestamente - nem sempre bem sucedidas.

Nesses vinte e um anos de O DIÁRIO, que quase coincidem com os meus 22 anos de profissão, muitas fases, muitos diretores, muitos donos passaram. O jornal parece ter uma consciência muito perfeita dessa epopéia. Não foi sem propósito que o folheto comemorativo não falou nos vinte e um anos de existência. Falou em vinte e um anos de sobrevivência.

É uma alegre constatação: sobrevivemos juntos.

 

Fonte: O Diário da Rua Sete – 40 versões de uma paixão, 1ª edição, Vitória – 1998.
Projeto, coordenação e edição: Antonio de Padua Gurgel
Compilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2018

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