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O café e a sua nobreza na República do ES

Joaquim Marcelino da Silva Lima, 1º barão de Itapemirim

Vale a pena demorarmos alguns instantes num rápido bosquejo da evolução da cultura cafeeira no Espírito Santo – matéria que, como se verá, deve ser tratada paralelamente com a história da involução da lavoura canavieira local.

Foi em meados do século que a rubiácea começou se destacando no conjunto dos produtos agrícolas da província. Em 1851, a produção fora de 83.790 arrobas, das quais se exportaram 83.234.(60)

Denunciando a preferência dos agricultores pela fava etíope, o presidente Evaristo Ladislau da Silva registrava, no Relatório de 1853: “A planta do café, para a qual muitos se vão passando, parece ir em aumento, porém, não o tratam bem na colheita e a maioria de arrobas que apanham não é compensada pelo preço que recebem por elas.”

Conseqüência dos anacrônicos processos utilizados pelos fazendeiros no trato das suas respectivas glebas.

O prejuízo apontado por aquele governante não perturbaria o rush cafeeiro, que prosseguiu avassalador – empolgando antigos fazendeiros e monopolizando o interesse dos novos. Os primeiros abandonavam a lavoura canavieira, empenho de pais e avós; os últimos traziam das terras donde vinham a imagem extasiante dos oceanos verdes.

Todos tinham os olhos postos no café. O quadro seguinte fala eloqüentemente quão sensível foi a substituição da cultura da cana-de-açúcar pela da rubiácea:

EXPORTAÇÃO DE CAFÉ E AÇÚCAR DA PROVÍNCIA DO ESPÍRITO SANTO(61)

(em arrobas)

Anos      Café                 Açúcar

1858     151 227           46 222

1859     136 102           39 822

1860     202 117           29 550

1861     223 809           21 843

 

Costa Pereira explicaria a razão da troca: preço cada vez mais animador da rubiácea, e transmigração de mineiros e fluminenses, dados, de preferência, à cultura do café.(62)

Analisando o fenômeno, Afonso Taunay acrescentou: “A plantação da cana e o fabrico do açúcar exigiam o emprego de muitos braços e a Província, pelos motivos muito conhecidos da escassa população, lutava imenso contra a crise do trabalho. Além disso, ocorria outro fator – a subdivisão das fortunas, de tal sorte que, muitas vezes, os filhos de um fazendeiro importante ficavam reduzidos à pobreza. Não era possível pois que se levantassem novos engenhos, ou se conservassem florescentes todos os antigos.”(63)

Resumindo: em 1840, havia paralelismo entre o decréscimo na exportação do açúcar e o acréscimo na do café; a exportação daquele produto que, em 1844, fora de 324.308 arrobas, chegaria, em 1891, a 456, não figurando mesmo na estatística de 1892. O café, que aparecia na estatística de exportação do ano de 1847 com 115.390 arrobas, em 1900 figuraria com 1.234.195.(64)

Em escala bem mais modesta do que na província do Rio de Janeiro, o Espírito Santo teve a sua nobreza do café representada pelos barões de Itapemirim,(65) Aimorés,(66) Timbuí(67) e Guandu.(68)

Concluindo: pertence ao Espírito Santo a exclusividade da produção do café capitania, (69) famoso pelas suas propriedades de aroma e sabor deliciosos.

 

NOTAS

(60) - TAUNAY, Hist. Café, III, 294.

(61) - Relatório de Costa Pereira Júnior, de 1862, já citado.

(62) - Relatório, de 1862, já citado.

(63) - Hist. Café, III, 305.

(64) - XAVIER, Marcha, II, 481.

– “Esta província já ocupa o quarto lugar, entre as que produzem café no Brasil. No exercício de 1885/6, a exportação foi de 343.520 sacas desse gênero; devendo dobrar em breve prazo, atenta a expansão que se vai dando ao plantio” (FIGUEIREDO, Breve Notícia, 88).

(65) - Primeiro, segundo e terceiro barões de Itapemirim, respectivamente Joaquim Marcelino da Silva Lima, Joaquim Antônio de Oliveira Seabra (seu genro, casado com Leocádia) e Luís Siqueira da Silva Lima, filho do primeiro. Joaquim Marcelino da Silva Lima, paulista de nascimento, veio para o Espírito Santo em 1802, estabelecendo-se em Benevente, onde fundou nas terras que obteve por sesmaria uma grande fazenda de cana-deaçúcar denominada Três Barras. Mais tarde, transferiu-se para Itapemirim, onde constituiu enorme fortuna. Esteve, várias vezes, à frente do governo provincial, na qualidade de vice-presidente.

Mais de quatrocentos escravos trabalhavam nas suas oito fazendas, das quais a de nome Muqui era suntuosa. Nela residia o barão.

ANTÔNIO MARINS escreveu o seguinte a respeito desse solar: “O palacete que habitava, à margem do Itapemirim, era construído no feitio dos castelos medievais, sobre o alto de uma colina de onde se descortinava a vastidão do Oceano. Escadarias de mármore com leões à entrada e torreões nos cantos. O interior era luxuoso e brunido, contendo biblioteca, salões de bilhar, sala d’armas e alcovas primorosas com leitos marchetados. Os salões eram adornados de quadros e grandes retratos de antepassados. As baixelas de prata pesada brilhavam na vasta copa severamente decorada e sombria. Como nos castelos feudais, também tinha os seus desvãos meio subterrâneos e capela magnífica” (Minha Terra, 137).

– Joaquim Marcelino foi casado, em primeiras núpcias, com D. Francisca do Amaral e Silva. Deste consórcio nasceram dois filhos: Claudina e Belarmino. Aquela desposou o coronel de milícias Inácio Pereira Duarte Carneiro, de quem falamos repetidas vezes quando estudamos a primeira metade do século XIX. Enviuvando, contraiu matrimônio com D. Leocádia Tavares da Silva. O primeiro barão de Itapemirim faleceu a dezoito de dezembro de 1860. Contava oitenta anos de idade. Referências mais desenvolvidas sobre a personalidade e atuação política de Joaquim Marcelino da Silva Lima, na obra supracitada de Antônio Marins, passim. Uma das filhas do primeiro barão de Itapemirim, D. Úrsula de Lima (D. Zé), casou-se com Martim

Francisco Ribeiro de Andrada (3.º deste nome), que presidiu a província em 1882. – O terceiro barão de Itapemirim, médico, foi senador federal pelo Estado.

(66) - Major Antônio Rodrigues da Cunha, casado com D. Tomásia, filha do 1.º barão de Itapemirim. Fazendeiro em São Mateus (MARINS, Minha Terra, 212).

– Na Síntese da História de São Mateus, EUJÊNIO DE ASSIS escreveu: “Um dos grandes incentivadores do plantio do café foi o Barão de Aimorés, com instalações completamente modelares.” Mais adiante, alude a um hospital que o barão manteve, em 1850, auxiliado pelo Dr. Júlio César Berenger Bitencourt e Francisco Caetano Simões. Nasceu em 1834, no município da Barra de S. Mateus, e faleceu a trinta e um de julho de 1893.

(67) - Olindo Gomes dos Santos Paiva – Fazendeiro em S. Mateus, onde faleceu a dezenove de agosto de 1883.

(68) - João Bernardo de Souza, segundo barão de Guandu, era coronel da Guarda Nacional e residia em Castelo.

(69) ANTÔNIO ATAÍDE publicou valiosa contribuição ao estudo do café capitania na RIHGES, vol. X, p. 180 ss. Aprendemos ali que a variedade em questão é obtida de plantas cultivadas à sombra, na região litorânea do Estado do Espírito Santo.

“Convém notar – adverte aquele autor – que tem sido experimentado o plantio do capitania pelos sertões, sem nenhum êxito. Não são conservadas as suas características diferenciais no tamanho das sementes, na cor e na gustação. Degenera logo no café comum. O crioulo, mesmo, sob o abrigo da sombra, não dá o capitania. O clima e o solo alteram a natureza do produto. As condições climatéricas e os agentes telúricos da nossa zona litorânea fixaram o habitat do tradicional capitania” (Op. cit. 183).

 

Fonte: História do Estado do Espírito Santo, 3ª edição, Vitória (APEES) - Arquivo Público do Estado do Espírito Santo – Secretaria de Cultura, 2008
Autor: José Teixeira de Oliveira
Compilação: Walter Aguiar Filho, novembro/2017

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