O Monstro – Por Adelpho Monjardim

Há mais ou menos cinqüenta anos, em um dos nossos Municípios sulinos, ocorreu espantoso fato, digno da exaltada imaginação de um Hoffmann.
Abastado fazendeiro, proprietário de muitas terras e pai de duas jovens, enviuvara cedo. Pai desvelado, aquelas duas moças eram todo o seu mundo. Suíço, era homem austero e de rígidos princípios.
Na mesma cidade residia um patrício, moço bem apessoado e galanteador, razão pela qual não gozava de boa fama. Bonitão, o Casanova conseguiu entabular namoro com a filha mais velha do fazendeiro, que surda às recomendações paternas deixou-se enredar pelas lábias do sedutor.
Encorajado pela conquista, sem despertar suspeitas começou a cortejar a mais nova das irmãs. Sibilino, conseguiu penetrar na intimidade das jovens e por fim as infelicitou.
Como sói suceder em tais ocasiões, o sedutor fugiu à responsabilidade, consumando-se a tragédia. O despertar das moças foi terrível. Apaixonadas pelo mesmo homem, tornaram-se inimigas irreconciliáveis. A falta era irreparável.
Homem rico e influente, o pai das moças virou meio mundo a fim de castigar o crápula: que soube se resguardar, fugindo à possibilidade de um desforço pessoal.
Não resistindo à humilhação a irmã mais velha suicidou-se, lançando antes a sua maldição ao perjuro: “Gritando morrerás entre lancinantes dores e, gritando, continuarás pela Eternidade!”.
A mais jovem desapareceu e, segundo consta, entrou para um convento, no Rio de Janeiro. Desgostoso, o pai faleceu pouco depois.
Um ano após a dolorosa ocorrência, por uma tarde de maio, o sedutor, então próspero comerciante, gozando excelente saúde, foi acometido de súbito mal. Dores atrozes se apossaram do seu corpo. Com as mãos contraindo o estômago saiu a gritar pelas ruas. A correr e a gritar como um possesso possuído do demo, com a multidão no seu encalço, caiu por terra. Gritando, gritando sem cessar, foi hospitalizado. Durante a semana que ainda teve de vida gritou sem parar. A maldição descera sobre a sua cabeça. Desde então na cidade e redondezas não cessaram os gritos. Por vezes o penitente se materializava, rogando que suplicassem à vítima o seu perdão. Tarde demais, ela já estava morta.
O Monstro, como ficou conhecido o fenômeno, atormentou por muito tempo a cidade, resistindo aos exorcismos e aos esconjuros. Certa noite, manifestando-se o fenômeno no morro em que se situava a igreja, dentro de um pequeno bosque, o pároco, acolitado por um grupo de fiéis, foi até lá para aclarar o mistério. Empunhando o crucifixo, que reluzia à luz dos archotes, foi ao encontro do desconhecido. Próximos de onde os gritos retumbavam, estes explodiram num único e tenebroso clamor. Súbito golpe de vento apagou as tochas e a escuridão imperou profunda e temerosa. O brado alucinante e sobrenatural, rasgando o espaço, se foi aos poucos diluindo, à proporção que se afastava. A debandada foi geral. O piedoso pároco ainda hoje busca o crucifixo de prata.
Por muito tempo a cidade viveu sob o peso da maldição. Dizem que, lá no Além, a vítima perdoou o algoz, voltando tudo à normalidade.
O fato é verídico. Não é lenda, não é ficção. Longo processo tramitou pelos nossos Tribunais.
Fonte: O Espírito Santo na História, na Lenda e no Folclore, 1983
Autor: Adelpho Poli Monjardim
Compilação: Walter de Aguiar Filho, novembro/2015
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