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Os cometas - Por Ormando Moraes

Três viajantes em Cachoeiro de Itapemirim, em 1917 - Bem vestidos e bem montados

Os "cometas", assim denominados os viajantes comerciais, porque apareciam nas cidades do interior de tempos em tempos, tiveram grande importância na época das tropas e dos tropeiros, com os quais se relacionavam e faziam muitos negócios.

Naquele tempo, o comerciante do interior dificilmente se aventurava à ir ao Rio ou a São Paulo para fazer compras, porque era muito inibido e tinha receio de ser ludibriado, de sorte que o papel dos "cometas" era de fundamental importância para manter as casas comerciais abastecidas de um tudo e, conseqüentemente, para proporcionar serviços de transporte de cargas a tropas e tropeiros.

Nas cidadezinhas do interior, quase sempre havia um "Hotel dos Viajantes", onde os "cometas" eram tratados a "pão-de-ló" e gozavam de muito prestígio, porque traziam toda sorte de notícias, orientavam os comerciantes nos negócios, eram entendidos de política, economia e futebol e faziam o papel de bancos, cobrando duplicatas e cumprindo ordens de pagamento. Alguns "cometas" mais antigos e de maior prestígio eram acolhidos, como hóspedes, nas casas dos grandes comerciantes.

Os, "cometas" viajavam montados em muares (burros, mulas ou bestas) com arreios de primeira e eram acompanhados de mais dois, três animais, que conduziam suas canastras repletas de amostras de tudo quanto era mercadoria. Às vezes, eles mantinham tropas completas para transportar não só amostras, mas também a própria mercadoria, como era o caso do Coronel Ricardo Gonçalves, de Cachoeiro de Itapemirim.

A chegada dos "cometas" às cidades do interior, na década de 20, era motivo de satisfação e alegria: eles traziam jornais e revistas para oferecer aos comerciantes e aos amigos e, à noite, na calçada ou na porta do hotel, formavam-se rodas de curiosos, para conversas que se estendiam até madrugadinha.

Sempre muito bem vestidos, falantes e comunicativos, quando os "cometas" chegavam a uma cidade, as moças ficavam alvoroçadas e os rapazes, despeitados, se enchiam de ciúmes e precauções. Havia lugares, segundo informa Dona Argentina Tristão, em que as moças eram proibidas de dançar com os "cometas" e, se desobedeciam, tomavam "chá de cadeira" nos bailes seguintes, em que eles não estivessem presentes. Os viajantes eram como os marinheiros, em matéria de amor: em cada lugar, uma namoradinha ou uma amante, ou as duas ao mesmo tempo. Mas também houve muitos casos de finais felizes, em que os "cometas" desposaram moças de importantes famílias das cidades que visitavam.

Conta Francisco Schwarz que os. "cometas" iam para Santa Leopoldina de lancha ou de canoa, pelo rio Santa Maria, partindo de Vitória, onde poucos paravam e que, nas canoas, havia duas classes de passageiros: a primeira era nos bancos e sob toldos, que os "cometas" usavam, e a segunda classe era no meio dos caixotes, sob o sol e a chuva. Para vender ao comércio de Santa Leopoldina, vinham até viajantes diretamente da Alemanha.

Em Cachoeiro de Itapemirim, centro comercial de importante irradiação para todo o sul do Estado, fixaram-se vários viajantes comerciais, os célebres "cometas" dos velhos tempos, muitos dos quais evoluíram para representantes comerciais, como o Coronel Francisco Gonçalves, Antônio Peixoto Serra, Manoel Leão, Mário Daher, João Moysés, e o mais famoso de todos, Joaquim Cecílio Teixeira Leão, o Quincas Leão, de intensa participação na comunidade local e indispensável componente de comissões de finanças que se organizassem para qualquer fim. Outros nomes de viajantes citados por José Maria de Oliveira, Argentina Tristão e Francisco Schwarz foram os de José Medina, Jorge Ananias, Manoel Soares, Ribeiro Martins e José Rios, sendo que este último deixou a profissão para ser hoteleiro em Santa Leopoldina.

Além dos "cometas", no tempo das tropas, havia ainda os mascates, geralmente sírios ou libaneses, tratados como, "turcos" e que também usavam muares em suas andanças, mascateando. Mas eram diferentes dos "cometas", pois não representavam firmas, nem vendiam aos comerciantes. Os mascates vendiam principalmente fazendas e miudezas no varejo, a prazo ou à vista, ao consumidor final, como se diz hoje em dia.

 

Fonte: Por Serras e Vales do Espírito Santo – A epopéia das Tropas e dos Tropeiros, 1989
Autor: Ormando Moraes
Acervo: Edward Athayde D’ Alcantara
Compilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2016

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