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Visitantes Ilustres do Convento da Penha – Diogo Antônio Feijó (ParteII)

Diogo Antônio Feijó

Vamos, porém, no registro dos visitantes ilustres, dar um salto de 1664 a 1842; e, daí por diante, relacionar alguns que visitaram o tradicional Convento, o que fazemos baseados em documentação fidedigna, citando datas precisas.

Começaremos pelo grande Diogo Antônio Feijó

Julho a dezembro de 1842

DIOGO ANTÔNIO FEIJÓ - NICOLAU PEREIRA DE CAMPOS VERGUEIRO — Diogo Antônio Feijó, esse meteoro que atravessou os céus do Brasil entre 1784 e 1843, o grande paulista que, na opinião de Otávio Tarquínio de Souza, não foi talvez excedido em prestígio e notoriedade nem por Pedro I, nem por José Bonifácio, e nem por Pedro II, também galgou as penedias onde se engasta o Convento da Penha, e lá no santuário famoso, dirigiu as suas preces à Santa.

Estava, então, em pleno declínio de sua vida tumultuária e sob as agruras das cruciantes dores de um desterro, embora em plagas nacionais, mas sem a menor consideração ao seu passado de inegáveis e prestimosos serviços à Pátria, sem qualquer respeito ao grave estado de sua saúde periclitante e aos seus últimos dias de vida, que já começavam a ser implacavelmente contados.

Embora Feijó não tenha sido justo perante a terra que lhe abriu os braços, embora tenha ele deixado palavras desfavoráveis à cidade de Vitória que o acolheu ao ser expulso da sua, o Espírito Santo se orgulha de o haver hospedado e de ter, em sua Capital, durante cinco meses, esta figura singular, filha de pais incógnitos como ele mesmo afirmava, surgindo à vida sob as capas de um "enjeitado" e atingindo, no País, as mais altas posições de consagrado homem público, com ou sem a batina que nem sempre envergava.

Nestes cinco meses, a terra capixaba abrigou em seu seio o venerando brasileiro que foi deputado às Côrtes Portuguesas, representando o seu glorioso Estado de São Paulo, que deu o que pode em favor da Independência, que foi novamente deputado e depois senador, Ministro da Justiça de Pedro I, em período difícil somente atravessado pela energia desassombrada que lhe não faltou para consolidar a incipiente soberania da Pátria, e a seguir, dirigi-la mais diretamente, quando lhe coube as culminâncias da Regência do Império.

Vamos, porém, deixar o período ascendente do ínclito paulista combatido como sempre são os grandes homens no entrevero das grandes lutas, combatido também pelos que se lhe nivelaram nos mesmos anseios de serviços à Pátria, como os Andradas, seus conterrâneos.

Acompanhemos-lhe o ocaso, a partir do ângulo em que começa o declínio, a descida que poucos conseguem evitar no transcurso da vida, embora lhes voltem as subidas nos gráficos da glória, depois da morte.

Sigamos os seus últimos passos, em 1842, no seu penúltimo lustro de vida e no final de sua existência, em 1843.

Já na casa dos sessenta anos, mas ainda com aquela fibra que lhe foi inquebrantável até os últimos instantes, Feijó ainda se metia em revoluções. Ele que as combateu a ferro e fogo, ele que as sufocou com o auxílio decisivo da espada invicta de Caxias, haveria um dia, de se render ao próprio Caxias, defensor enérgico da legalidade. E assim era que, em 1842, rebelde, assim se dirigia ao grande soldado, na sua célebre carta de Sorocaba, datada de, 14 de julho, num desabafo de mágoas, cuja autoria não se podia imputar ao chefe militar que cumpria ordens:

"Quem diria que em qualquer tempo o Sr. Luís Alves de Lima seria obrigado a combater o Padre Feijó?"

valendo-lhe a resposta, imediata, segura, serena, mas enérgica, do consagrado cabo de guerra:

"Quando pensaria eu em algum tempo que teria de usar da força para chamar à ordem o Sr. Diogo Antônio Feijó?"

Cousas do destino.

Antes, Caxias cumpria ordens de Feijó, eliminando movimentos subversivos. Depois haveria de prendê-lo, como revolucionário, esposando causas que lhe pareceram ser favoráveis aos destinos da Pátria.

Um era digno do outro; e, quando Caxias entrava em Sorocaba, vitorioso, para eliminar o último reduto de rebeldia, todos fugiram — exceto o Padre Diogo Antônio Feijó que o esperou com sobranceria, sabendo que seria preso porque assumia a responsabilidade do movimento. Entregue, então, à custódia do 1º Tenente Tristão Pio dos Santos e sem estar propriamente preso, Monte Alegre, Presidente da Província de São Paulo, determinou a Caxias que o mandasse para a Capital, o que foi feito, já agora entregue ao Coronel José Leite Pacheco, embora sempre protestando contra a arbitrariedade que se fazia a um Senador do Império.

De São Paulo, Monte Alegre o mandou conduzir para o Rio de Janeiro, via Santos, já agora acompanhado de Vergueiro também seu companheiro de rebeldia e de castigo.

Sob a guarda do mesmo Tenente Tristão Pio dos Santos foram ambos embarcados em Santos no vapor AMÉLIA a 22 de julho do mesmo ano de 1842, chegando ao Rio de Janeiro a 23, trazendo Vergueiro em sua companhia um escravo, e Feijó, um criado.

Desde a sua saída de São Paulo, já não restava dúvida de que eram, de fato, prisioneiros do governo; e, ao chegarem ao Rio de Janeiro, piores providências os esperavam. Nem sequer lhes foi possível desembarcar, pois que lhes estava destinado o desterro para o Espírito Santo, para onde vieram depois do transbordo do AMÉLIA para o brigue-escola ANDORINHA, da Marinha de Guerra, sob o comando do capitão-tenente Antônio José Teixeira da Paixão, que 2 dias depois, a 25, deixava a Guanabara, não sem antes ser a bolsa magríssima de Feijó abastecida com algum dinheiro que lhe levou a bordo o seu fiel amigo e compadre Bernardo José de Figueiredo, além de roupa de que não dispunha. Ao saírem do Rio de Janeiro, os dois grandes senadores do Império desconheciam o seu destino, mas no dia seguinte, sabê-lo-iam, quando desembarcaram em Vitória, que os acolheu durante cinco meses — de julho a dezembro.

Tiveram melhor sorte do que o Cônego Geraldo Leite Bastos, Limpo de Abreu e Tôrres Homem, que foram deportados para Lisboa.

Ao primeiro, Feijó dirigiu então a seguinte carta, da Capital do Espírito Santo:

"Meu caro Geraldo. Aqui estou degredado na Vitória, tendo vindo deportado com o Vergueiro para o Rio, onde nem ao menos se nos permitiu desembarcar, estando apenas um só dia no porto. Nesse pouco tempo, o nosso bom compadre Figueiredo fez-me toda a casta de obséquios, evitando que eu viesse somente com a roupa que trazia no corpo. Não tive o gosto sequer de beijar a mão à tua virtuosa mãe, e aqui viemos ao abandono, e a não ser a caridade do Comandante, o Paixão, que nos pôs à sua mesa, teríamos de comer a ração do porão... É assim que o Brasil, tem Constituição... Muito senti o teu degredo, porém, ao menos, estás em melhor mundo e livre da solidão desta Vitória. São Paulo emporcalhou-se... O resto da província entregou-se à sorte. Talvez aí vejas nos jornais do Rio a minha correspondência com o Costa, e por ela podes fazer idéia do que por cá tem havido. Moro aqui com o Vergueiro, único companheiro que me resta: ele pede-me que o recomende à tua lembrança. Dê saudades ao Meireles, e um apertado abraço ao nosso Limpo, a quem depois escreverei, que agora não posso. A minha enfermidade cada dia mais se agrava, sem esperança alguma de melhora: não sei se ainda terei o prazer de abraçar-te; entretanto continuo resignado com a vontade de Deus. Não te descuides de escrever-me, pois se sempre apreciei a tua correspondência, muito mais agora neste ermo onde habito. Sê feliz e dispõe de mim como teu amigo Feijó. Vitória, 11 de agosto de 1842."

A vida inicial de Feijó foi a de Província e na sua ascendência sempre se lhe notou a tônica de provinciano — até na linguagem, sem que isso em nada desmerecesse o seu inconteste valor. Todavia, depois de Itu, Sorocaba, Campinas, São Paulo, Rio de Janeiro, Lisboa e após uma acidentada passagem pela Inglaterra e regresso à Pátria onde atingiria posições culminantes — ao chegar em Vitória haveria de achá-la solitária e ainda mais um "ermo onde habito".

Não era tanto assim. O "ermo" estava localizado, pelo menos, ao lado e bem próximo do tradicional Palácio do Governo do Espírito Santo, bem junto da Catedral de Vitória e a alguns passos de outra igreja — a de São Gonçalo e a da Misericórdia, do Convento de São Francisco e do Carmo, além da de São Tiago, no próprio Palácio e a de Santa Luzia, hoje entregue aos resguardos do Patrimônio Histórico.

Pelo menos para rezar, não lhe faltava ambiente propício.

A casa na qual se abrigou o ilustre brasileiro em companhia do seu não menos ilustre companheiro, Senador Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, estava situada na parte alta da cidade de Vitória, à hoje Rua Muniz Freire n° 5 — sobrado fronteiro à rua da Assembléia n° 3", diz Basílio Carvalho Daemon.

Esse sobrado já foi demolido. Ficava no hoje terreno baldio nos fundos da Associação dos Funcionários Públicos do Espírito Santo, quase defronte da Loja Maçônica "União e Progresso".

Certos acontecimentos que nele se verificaram levaram o povo a cognominá-lo de "casa fatídica". O mesmo Basílio Carvalho Daemon — historiador capixaba, registra em seu livro "PROVÍNCIA DO ESPIRITO SANTO", página 317:

"Casa fatídica, pois que ali em frente existiu por muitos anos o Pelourinho, ali estiveram dois dos nossos grandes vultos políticos deportados, duas tipografias quebraram-se, sendo outra seqüestrada, adoeceu nela mortalmente um dos redatores e proprietário do Correio de Vitória e ainda o redator da Atualidade ali faleceu neste ano de 1879."

Há ainda uma segunda carta de Feijó, expedida de Vitória, à sua irmã Maria Justina, concebida nos seguintes termos:

"Ma. Justina. Pode ser que a esta hora tenhais recebido algumas das cartas que vos tenho escrito, que muito desejo resposta. Eu apesar de já estar me curando com as feiticeiras, ainda estou no mesmo estado, porém felizmente não estou pior e nada me falta senão a companhia dos que me amão. À (sic) aqui um convento no pináculo de um morro de pedras, beira mar, onde vou passar semanas, e donde vim agora, tendo lá ido rezar o dia das Dores e, onde fui cantar Missa a N. Sra. Estimarei que (palavras ilegíveis) boa e devota feita e que Sinhá grande e todos os amºs, estejão em paz e não morrão sem eu lá chegar para o que espero em Deus. Sauds. a Sinhá Grande, a Pe. Ant. que estude e faça-se devoto para ser bom Padre, a meus Compes. Querubim, a Lhainha. Joaqm. dos Santos, Salomé e a toda a fama. e o mesmo fará aos vizinhos e dai-me noticias do Pe. Miguel, Diogo, Luciano Teixeira e aos mais que nos frequentavão. Enfim a Ds. té quando o mesmo Ds. quiser. Victória, 20 de 7bro. de 1842. De vosso mano amo. Diogo."

Diz Feijó que estava se curando com as feiticeiras... Bem. Alguém já se interessava por ele, mesmo sendo feiticeiras...

Mas, muito acima das feiticeiras, Diogo Feijó haveria de receber as graças de Nossa Senhora da Penha.

As autoridades espírito-santenses não lhe eram tão adversas como as do Rio de Janeiro e nem tão severas como as de sua terra natal, pois que, em Vitória, não era tolhido em sua liberdade, tanto assim que deixava a Capital do Espírito Santo e ia "passar semanas" ao Convento da Penha, em Vila Velha como ele mesmo declara.

Apesar de estar nos seus últimos dias de vida, Feijó não morreria em Vitória, pois que a 15 de dezembro do mesmo ano de 1842, chegava de retorno ao Rio de Janeiro pela sumaca FLOR DA VITORIA, sendo acompanhado pelos padres Matias Pinheiro Furtado, cônego Manuel de Freitas Magalhães e frei José de Santa Helena.

Este último veio a ser guardião do Convento de São Francisco, em Vitória, oito anos depois — em 1850.

Não era, em 1842, guardião do Convento da Penha, pois que, na chegada de Feijó a Vitória, em julho de 1842, o guardião era Frei Gustavo de Santa Cecília, falecido em Nova Almeida em 1853. Em dezembro, quando voltou para o Rio de Janeiro, já havia outro guardião da Penha — o Fr. Vitorino de Santa Felicidade, desde 31 de outubro.

Esses franciscanos o acolheram e certamente o fizeram com carinho, pois no Convento "passava semanas".

Fizeram-no cristamente, sem mágoas contra o deputado que lhes foi contrário em 1828.

A 13 de maio de 1843, sete meses antes do seu desenlace verificado a 10 de novembro, Feijó, na sua defesa perante o Senado, se expandia, sem convencer porém, contra a terra que o recebeu na sua queda, pois que naquela defesa escrita afirmou:

"... enfermo como todos o reconhecem fui lançado nas praias da Vitória, sem que nem ao menos se me prestassem os alimentos na viagem e sem que lá se me proporcionassem meios de conservar a vida..."

A revolta íntima do ínclito paulista fazia-o exagerar as cousas e os fatos.

Ele mesmo afirmou que foi lançado nas praias de Vitória, "enfermo, como todos reconhecem." A sua situação era, na melhor das hipóteses, a de um hemiplégico. Mas mesmo assim, mãos e braços piedosos o conduziriam desde Vitória até os píncaros do Convento da Penha, subindo a tradicional e escarpada ladeira que dá acesso ao histórico mosteiro, e isto por muitas vezes. Fazendo tudo isso com o auxílio que não poderia ser somente do seu criado, em Vitória permaneceu cinco meses e teve forças para ainda chegar ao Rio de Janeiro e ir até o próprio Senado.

Quando foi preso em São Paulo por Caxias e, após lhe responder altivamente que na prisão para onde ia só necessitava de uma esteira, foi conduzido em sua cadeira, por quatro homens. Já era paralítico. Assim veio para Vitória.

Não foi, por isso, razoável o seu desabafo de que no Espírito Santo "não lhe proporcionassem meios de conservar a vida..."

O contrário, deveria ter afirmado.

Note-se ainda que, ao chegar à terra do Domingos Martins, em julho de 1842, estava no Governo da Capitania um seu conterrâneo — Joaquim Marcelino da Silva Lima, mais tarde 1° Barão do Itapemirim, substituído a 10 de agosto pelo Dr. João Lopes da Silva Couto.

A tradição que nos deixou o Barão do Itapemirim, foi de cavalheiro de alta distinção e que sempre acolheu fidalgamente a todos. Não seria a Diogo Feijó que ele iria negar ou restringir o que sempre dispensou aos seus concidadãos, muito embora deixasse o governo poucos dias após a chegada dos desterrados.

Ainda em favor da gente espírito-santense, assinalaremos que a mesma não lhe foi tão hostil, pois além das idas, que lhe proporcionava, ao Convento da Penha, ainda o levava à Chácara e casa grande da família Monjardim, em Jucutuquara, casa esta hoje transformada em Museu Histórico do Espírito Santo .

Se ainda invocarmos o registro de Daemon, poderemos citar o seguinte trecho do livro mencionado (página 318):

"Aqui mostrou-se muito amigo do Capitão-mor Siqueira com quem sempre estava e com quem passeava todas as tardes".

Esse espírito-santense de quem Feijó se tornou amigo e que, segundo o historiador capixaba citado, era seu companheiro de passeios, todas as tardes, era o Capitão-mor Manoel de Siqueira e Sá, bisavô do Dr. Olinto Aguirre.

 

Fonte: O Convento da Penha, um templo histórico, tradicional e famoso 1534 a 1951
Autor: Norbertino Bahiense
Compilação: Walter de Aguiar Filho, março/2017

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