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Vitória e os navios

O Transcol (ônibus) na curva do Saldanha da Gama

Sempre me fascinaram os navios e as girafas, desde a infância. Conheci-os primeiro nos livros ilustrados que papai levava do Rio ou São Paulo para o seu filho curioso e leitor apaixonado que crescia livre nas serras do Caparaó. Pessoalmente, conheci ambos aos dez anos, quando fui ao Rio, pela primeira vez, com meu pai.

Confesso que as girafas me entristeceram com os seus olhos pedintes e aquele limitado espaço que lhes dão os zoólogicos, para suas enormes pernas e desconjuntados passos. Faltava-lhes a alegria da liberdade. Espero, ainda, vê-las mais felizes em seu espaço natural, no Quênia ou Tanzânia, claro. Mas os navios? Esses não! Estão sempre passando, indo e vindo, ou, quando parados, carregando e descarregando para tornar a partir.

Com a morte de meu pai, vim a Vitória, pela primeira vez, com meu tio. E me apaixonei por esta cidade e por seus navios. Sempre que podia, subia as escadas do Palácio Anchieta e ficava horas literalmente "a ver navios", até o momento de pegar o ônibus e voltar para Guaçuí.

Fui, cada vez mais, sendo atraído por Vitória e por seus navios. Eu sabia que um dia nos iríamos definitivamente encontrar. E a oportunidade surgiu com um edital no jornal convocando professores para a Escola de Aprendizes Marinheiros. Eu, preparadíssimo, só poderia passar. Não deu outra. Durante dez anos, fui professor de marinheiros, emn frente ao mar. Chegando ou partindo, havia sempre um navio a avistar. Algumas vezes, embarquei com meus alunos e, enquanto eles aprendiam as duras faxinas do homem do mar, eu ficava na proa, ou no convés, conversando com os oficiais ou o comandante e aprendendo também um pouco dessa profissão milenar.

Homem de letras, nunca entendi muito bem o que faz um navio enorme daqueles flutuar ou um jato voar. É claro que já estudei tudo isso. Mas prefiro acreditar que são milagres da audácia do homem de querer se tornar o criador.

O melhor de uma viagem no mar é ver, quase sem sentir, se o mar é de Almirante, a terra ficar cada vez mais distante e sua cumplicidade com o mar aumentar. Ele começa a mostrar-lhe seus segredos: os peixes que pulam ou mesmo voam distâncias enormes, os golfinhos que aparecem aos bandos e até baleias. Você nunca está só, no mar. Toda a natureza vem te acompanhar. Taí o Amyr Klink que não me deixa mentir.

Melhor que viajar de navio é ver os navios passar. Durante vários anos, antes da terceira ponte, fiz o trajeto Vila Velha - Vitória e vice-versa, pelas lanchas da Comdusa. Vivi vários momentos de emoção quando a pequena lancha diminuía sua velocidade ou parava totalmente para deixar passar aquele enorme navio cargueiro gentilmente carregado por dois rebocadores. Não há ninguém que esteja passando pela beira-mar que não pare para ver um navio daqueles sendo virado pelos rebocadores, para ficar de frente para onde irá. É um espetáculo imperdível, gratuito, constantemente oferecido aos habitantes de Vitória e seus visitantes.

O bom de Vitória também é que de qualquer lado você vê o mar. É só subir um pouco e contemplar o visual. Bom mesmo é ser funcionário público e trabalhar no Edifício Fábio Ruschi; estes são uns privilegiados. É só ir para a janela e começar a contar os navios. E tentar adivinhar de onde vêm pelas bandeiras. É melhor que qualquer aula de geografia. E atender a qualquer público, claro.

Quando se vem da curva do Saldanha e após ter sobrevivido a um arrocho do amarelinho do Transcol, você recebe de presente a vista do Porto de Vitória. São poucos segundos de tanta beleza que você tem de prender a respiração, segurar o volante e curtir o visual. Pronto. Já passou. Agora você tem de batalhar uma vaga para deixar o carro ou entregá-lo para os ladrões da Mesbla, se quiser admirar um pouco mais o cenário. Sair caminhando pela beira-mar até o cais (desativado?) da Comdusa é uma boa. Ver os navios chegando e partindo. Observar os insistentes pescadores de boca de esgoto e a poluída baía de Vitória. Só não dá para tomar uma cerveja vendo os navios no cais. Os bares estão todos mais pra baixo ou na outra rua. Enfim, nem tudo é perfeito. Se quiser ficar a ver navios, enquanto saboreia uma geladinha, o jeito é ir para Camburi ou Praia da Costa. Lá dá.

Dizem que Amsterdam é parecida com Vitória. Eu não a conheço. E que as três baías mais belas do mundo são as do Rio de Janeiro, Hong Kong e Sydney. As duas primeiras eu conheço. São realmente bonitas e grandiosas. Mas eles que fiquem com as deles. Ee é que não troco Vitória e seus navios por nenhuma delas.

 

Fonte: Escritos de Vitória, 5 - Porto (1994)
Autor: Francisco Aurélio Ribeiro
Compilação: Walter de Aguiar Filho, maio/2012 

 

 

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