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Quando o Penedo falava, 1927 - Por Elpídio Pimentel - Parte III

Capa do Livro: Quando Penedo falava, 1927 - Autor: Eupídio Pimentel

Segunda narrativa – Presidentes do Estado

- Estava à sua espera, vovô. Mamãe me disse que o senhor tinha ido fazer compras, mas que não demoraria...

- É verdade; temos que continuar a nossa conversa de ontem. Se me ouvires com a necessária atenção, lhe darei bonita bola de borracha, que comprei, lembrando-me de ti.

- Então já pode considerar a bola como dada, porque lhe prometo que o ouvirei atentamente.

- Está bem. Falei-te, ontem, do nosso atual Presidente do Estado – doutor Florentino Avidos, a quem nós, espírito-santenses, estamos devendo máximos benefícios: a remodelação de nossa Capital; a construção da grande ponte, que a ligará ao continente; a estrada de ferro litorânea; o prosseguimento das obras do nosso porto, há tanto tempo interrompidas – são os seus serviços de maior relevo e inesquecíveis.

Antes dele esteve na Presidência o senhor coronel Nestor Gomes, cavalheiro generoso e prestado amigo da tranqüilidade e do progresso.

Durante todo o seu governo, todos vivemos sem apreensões, sem temores, porque, ao seu espírito tolerante, repugnavam os ódios e as perseguições. Fez  notáveis benefícios ao Estado: criando escolas, nomeando professores, abrindo estradas – de ferro, de automóvel e de rodagem, para pedestres e cavaleiros...

- Que são “pedestres”?

- São os que caminham a pé. Realizou tudo isso e mais ainda – saneou zonas paludosas, favoreceu a prosperidade dos municípios, amparou o desenvolvimento da indústria e da lavoura, iniciou a remodelação de Vitória, prometendo-lhe lindas avenidas e praças, bons edifícios para o mercado, o teatro, o funcionalismo público; suprimiu impostos, isto é, deixou de exigir dos habitantes do Estado muitas das quantias, que eles eram obrigados a pagar, até poucos anos atrás, para o aumento de nossa riqueza pública.

- Vou pedir-lhe que mande dar as criançinhas da idade de Moema um jardim infantil, como aquele que a minha professora me mostrou, no seu álbum de gravuras.

- Ele já terminou o seu período governamental e não pode mais atender-te. Ao seu substituto, o doutor Florentino Ávidos, que será, até 1928, o nosso Presidente do Estado, com as mesmas obrigações e privilégios, que tem quantos sobem a esse posto elevadíssimo, poderás pedir, para os teus maninhos, um jardim infantil.

- Sim, e vou pedir-lhe mais... outra escola boa, onde a minha tiazinha Célia, que já quer, por força, ser boa dona de casa, possa estudar e desenvolver-se.

- Ah! Queres também uma escola doméstica? Excelente lembrança. Mas já está parecendo enfastiado. Não me queres ouvir mais contar-te toda a história do Espírito Santo, que é longa, mas muito necessária e proveitosa?

- Não, senhor. Estou gostando muito, porque só agora principio a conhecer bem a história da terra querida, onde nasci e quero viver. Serei um mal espírito-santense, se não quiser ouvi-la atentamente, com prazer, até o fim. Minha professora diz sempre, na escola, que devemos querer muito bem aos nossos pais, aos nossos mestres e à nossa terra...

- Gosto muito de teu amor ao estudo e dos carinhos, que tens para com nosso solo natal. Vou prosseguir.

Antes de o coronel Nestor Gomes tomar conta da Presidência do Estado, houve muitos outros presidentes, todos poderosos, tendo sob a sua guarda a população espírito-santense, com os seus interesses, as suas riquezas, as suas aspirações de paz e grandeza. Foram eles, dos mais recentes para os primitivos: doutor Bernardino de Souza Monteiro, coronel Marcondes Alves de Souza, doutor Jerônimo de Souza Monteiro, coronel Henrique da Silva Coutinho, doutor José de Mello Carvalho Muniz Freire (duas vezes), doutor José Marcelino Pereira de Vasconcelos e doutor Graciano dos Santos Neves, estes, os constitucionais, até o ano de 1892, quando foi proclamada a primeira reforma de nossa Constituição, elaborada pelo doutor Muniz Freire, espírito-santense distintíssimo no cultivo das letras jurídicas, com a colaboração do velho douto e capixaba Manoel Augusto da Silveira.

Todos esses presidentes terminavam, de acordo com aquela lei constitucional, os seus períodos administrativos em 23 de maio, dia feriado, porque lembra o inicio do povoamento de nossa terra; agora, porém, com a sua quarta reforma, do dia 24 de março de 1923, completada pelo ato adicional de 5 de fevereiro de 1924, ratificado por mais de quatro quintos das Câmaras ou administrações municipais, os períodos governamentais terminarão em 30 de junho.

- Pare um pouco, vovozinho; não sei o que o senhor quer dizer com “ratificado” e “Constituição”.

- Ratificado quer dizer confirmado, apoiado, sustentado; e a Constituição é o regulamento fundamental do Governo, que indica aos Presidentes do Estado e ao povo, que os elege, seus respectivos deveres e regalias. Antes daqueles Presidentes, o Estado foi dirigido, durante cinco meses, por uma Junta Governativa, composta dos senhores coronel Ignácio Henrique de Gouveia, doutores Graciano dos Santos Neves e Galdino Teixeira Lins de Barros Loreto, os quais tiveram como seus antecedentes, na chefia do Estado, durante dois anos e dois meses, aos senhores doutor Antonio Gomes Aguirre (duas vezes), Barão de Monjardim (Alpheu Adelpho Monjardim de Andrade e Almeida), coronel Henrique da Silva Coutinho, doutor Constante Gomes Sodré e doutor Afonso Cláudio de Freitas Rosa.

Esses seis governadores, dos quais acabei de te dar os nomes, exerceram os seus mandatos logo depois de proclamada a República Brasileira em 1889, em quanto o sistema de governo republicano se firmava. Quatro deles foram nomeados pelo Governo Provisório, que estava administrando o Brasil, no lugar de D. Pedro II, o nosso ultimo imperador. Nesse tempo, em junho de 1891, quando era governador Constante Gomes Sodré, tivemos a nossa primeira constituição estadual, de caráter provisório. Depois da grande reforma, feita em 2 de maio de 1892, de que já te falei, os presidentes passaram a ser eleitos, de quatro em quatro anos, pelos habitantes do Espírito Santo, mas somente pelos que sabem ler e escrever...

- E esses Presidentes todos que é que fizeram em favor de nossa terra?

- Muita coisa. Todos trabalharam, patrioticamente, esforçando-se no empenho de melhorar as condições econômicas, industriais, agrícolas, políticas e literárias do Espírito Santo. O doutor Bernardino Monteiro preocupou-se com as vias de comunicação, o serviço de abertura de muitas estradas, notadamente o rodoviário...

- Meu avô, porque é que o senhor não se esquece das “palavras difíceis”? Não sei o que seja rodoviário.

- É o conjunto das estradas de rodagem de um Estado, dos seus caminhos de penetração e vicinais, para carruagens...

- Outra vez! Assim não posso compreendê-lo.

- Tem paciência, meu querido Glauro; às vezes me esqueço que estou conversando contigo e suponho que o teu vocabulário já é igual ao meu. Mas “caminhos vicinais” são os que ligam os municípios, uns aos outros. Além das estradas, o doutor Bernardino Monteiro economizou sensatamente as rendas do Estado, pagou-lhe grande parte de suas dívidas e protegeu-lhe a instrução pública.

O senhor Marcondes Alves de Souza percorreu todos os municípios do Estado e deu-lhes o que desejavam, realizando uma administração próspera e louvável. O doutor Jerônimo Monteiro de Souza Monteiro trabalhou muito e deixou seu nome ligado a feitos inesquecíveis na história do espírito-santense: deu luz e bondes elétricos, água encanada e esgotos higiênicos à população de Vitória, mandou construir fábricas importantes no interior do Estado; remodelou a nossa Capital, que era uma cidade feia, pantanosa, suja e escura, com ruas tortas e casarões antiqüíssimos; reformou o nosso processo administrativo e o judiciário; auxiliou o funcionalismo público; e reorganizou a instrução, favorecendo o desenvolvimento das nossas letras e artes.

- E por que não deixaram que ele continuasse?

- Porque o prazo administrativo de quatro anos, para cada Presidente, é fatal e improrrogável, de acordo com a nossa Constituição, que condena os privilégios e monopólios. Antes dele, houve o governo de Coronel Henrique Coutinho, que se absorveu em grande luta política e, perturbado por ela, pouco pode fazer em favor dos interesses do Estado. O doutor Muniz Freire deixou também, em nossa história, as fulgurações do seu grande talento e do seu profundo amor à terra espírito-santense: reformou a instrução pública, de acordo com as melhores lições da pedagogia; ligou o Estado ao Rio de Janeiro por uma estrada de ferro – a Leopoldina, e mandou construir os primeiros edifícios públicos notáveis – o quartel da Polícia, o palácio da Justiça e o teatro Melpômene, hoje demolido.

- Conheci esse teatro: foi lá que ganhei vários brinquedos nas festas domingueiras do Chocolate, aquele preto pernóstico, que gostava de se exibir de fraque e cantava modinhas em línguas estrangeiras.

- Exatamente. Também, no tempo do doutor Muniz Freire, mandamos muita gente nossa para a campanha de Canudos, na Bahia, e ainda foi criado, pelo papa Leão XIII, em 1895, o nosso Bispado. Mas, para finalizar o longo “cavaco” de hoje, ainda preciso dizer-te que o doutor Graciano Neves governou somente dezessete meses, e que o doutor Afonso Cláudio foi o nosso primeiro governador republicano.

Agora vamos ao jantar, que está esfriando, para que não te prives de assistir, no Cine, às façanhas do Tom Mix.

 

Fonte: Quando o Penedo falava, 1927
Autor: Elpídio Pimentel
Compilação: Walter de Aguiar Filho, julho/2015

 

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