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As Famílias Portuguesas Radicadas no Espírito Santo

Aristeu Borges de Aguiar, presidente do estado (1928-1930), bisneto de Francisco Coelho de Aguiar que era natural da Ilha Terceira, estabeleceu-se em Vitória antes de 1830, tendo sido Conselheiro Geral de 1830 a 1834

Fomos descobertos por portugueses, o Brasil, o Espírito Santo. Sabe-se a saga desenvolvida por Vasco Fernandes Coutinho e seus heróicos 60 desbravadores que, deixando Portugal, uns, obrigados, outros, de livre vontade, vieram iniciar a colonização daquela que foi denominada de undécima capitania, enfrentando matas fechadas, clima inóspito, além da reação natural e feroz do dito gentio, ofendidos que se sentiram por estar suas milenares posses invadidas pelo colonizador branco.

Desses primeiros anos, primeiras décadas, primeiros séculos, até, pouco se sabe das famílias portuguesas que nestas terras tenham aportado.

Gilson Caldwell Nazareth, genealogista fluminense, que mantém, na página João do Rio, uma seção onde trata de genealogia e ligações com a terra capixaba, até que tem conseguido algum sucesso, pesquisando nos arquivos da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, detentora de extenso arquivo eclesiástico, que remonta ao século XVI. Marcopolo, também pesquisador fluminense, (página Sala de Estudos) mas, mais ao norte (região de Macaé e Campos), também tem fragmentos de família coloniais capixabas.

Aqui no estado, temos alguns pesquisadores que tentam desvendar as origens da nossa população, tais como Aldo Andrich, Galbo Nascimento, Glauro Gianordoli Giestas, João Luiz Castello Lopes Ribeiro, Letícia Fundão Giestas, Marcos José Netto Andrade, Marcus Benatti Antonini Rangel Pimentel, Maria Lúcia Machens (ora baseada no Rio de Janeiro), Mário Armando Furtado Monjardim, este que vos fala e Rogério Frigério Piva. Temos também os neófitos Gerson de Moraes França e o nobre colega aqui ao lado, professor doutor Gabriel Augusto de Mello Bittencourt, que vem desenvolvendo a genealogia familiar com brilhantismo. São pesquisas geralmente centradas na Grande Vitória, e que atingem a segunda metade do século XVIII, com muito custo, pois, adentrar a primeira metade daquele século acaba se transformando em aventura pura, visto a quase total inexistência de documentação, quer oficial, quer eclesiástica. Nossa documentação eclesiástica, inclusive, tem perdidos, desaparecidos, ou arquivados em lugar incerto e não sabido, pelo menos 17 livros de batizados, 8 livros de casamento e 6 livros de óbitos, o que poderia levar a história genealógica de Vitória ao século XVI, com total segurança. Falar em genealogia capixaba do século XVI à primeira metade do século XVIII é quase contar uma fábula.

 

Os portugueses

Não tivemos um fluxo imigratório concentrado de portugueses para o Espírito Santo como o italiano (cerca de 38.000 pessoas, em 30 anos) e, em menor escala, o germânico (em torno de 4.000). Não tivemos navios inteiros desembarcando nos portos locais as quantidades de imigrantes que afluíram a então capitania, como ocorreu a partir de 1847, com as imigrações de germânicos e italianos, pois os que vinham, eram colonizadores, inseridos no processo de colonização, e, particularmente, não os considero imigrantes, na acepção do termo. Vinham de forma esparsa, aportando, ora em Salvador, ora em Recife, ora Rio de Janeiro, os mais importantes portos da era colonial. Chegaram, também, em processos promovidos pelos donatários, que iam em busca de colonos (nem sempre com sucesso). Havia, também, a própria migração interna. É marcante a quantidade de famílias cariocas do primeiro século que tem origem em capixabas, ou em portugueses que para cá vieram e posteriormente, se mudaram para o Rio de Janeiro recém fundado (1565). Percorrendo a obra de Carlos Grandmasson Rheingantz (1915-1988)[1] isso é fácil de ser verificado.

Outros capixabas, ou a princípio, portugueses residentes na capitania, que se mudaram para outras povoações, vão formar os núcleos iniciais de diversas capitanias, e até há o caso de um capixaba, neto de nosso primeiro donatário, nascido em Vitória, João de Melo Coutinho (c.1565-1601), que, hoje, é considerado, pelos genealogistas portenhos, ancestral de toda a elite criola[2] argentina, inclusive da futura rainha da Holanda, a princesa Máxima Zorreguietta Cerruti, esposa do príncipe Guilherme, futuro rei da Holanda[3].

Até 1808, quando o Brasil era efetivamente colônia (legalmente, ainda seria até 1815), não se pode identificar o português que aqui chegava como imigrante, em face à intrínseca dependência e ligação do Brasil com Portugal. Após essa data, com a independência nacional já em curso, aí sim, podemos falar em imigrantes. O Arquivo Nacional efetuou um levantamento da movimentação de portugueses no Brasil, entre 1808 e 1842, e nele observamos a entrada de diversos imigrantes, sendo que para o Espírito Santo temos 325 entradas, naquele período. Mas são poucas as famílias portuguesas que chegaram ao Espírito Santo. Em geral, os portugueses vinham solteiros, tentar melhoria de vida, fugindo do alistamento militar ou das péssimas condições de vida que tinha nas suas vilas, e aqui acabaram constituindo suas famílias, casando-se ora com filhas de outros que imigraram antes deles ou com filhas de famílias mais antigas da terra.

 

Viana

Apenas uma vez tivemos uma afluência mais concentrada de portugueses, qual seja, os imigrantes, nem tão portugueses, mas açorianos, que, entre 1813 e 1814, chegaram em 4 levas, em número de pouco mais de 200, no total. São esses imigrantes que vieram fundar a Colônia de Santo Agostinho, experiência pioneira na tentativa de colonização de sertões inóspitos, Brasil a fora, já um preâmbulo da Independência, que se oficializaria em 1822. É essa colônia o núcleo da nossa atual Viana, que completará em 2013, seus 200 anos bem vividos.

Entre as famílias formadas após a chegada, existe a de Antonio de Freitas Lira (?-1842), capixaba que provavelmente descende do português João Trancoso de Lira, capitão de artilharia que para cá veio em 1646. Conta a lenda que, durante a recepção feita pelo governador Francisco Alberto Rubim da Fonseca e Sá Pereira (1768-1842), o jovem soldado, da guarda do palácio, impressionado com a beleza de uma das seis irmãs, Luiza Aurélia da Conceição (1795-1890), à época com 18 anos, que acabava de chegar, tocou de leve seus cabelos cacheados. Rubim viu e não gostou: na hora declarou o noivado dos dois, para reparar a “afronta” que Antonio havia feito à honra da moça. Lenda ou não, o fato é que se casaram cerca de 3 meses depois da chegada. Luiza Aurélia era uma das seis irmãs que, vindas dos Açores (Horta, Ilha do Faial) com o pai viúvo, deparam-se com a morte do genitor, quando da chegada ao Rio, e vem apenas as seis, para Viana. As idades variavam entre 20 e 10 anos. Em poucos anos estavam todas casadas. Repetem, assim, o caso célebre de Minas Gerais (as chamadas “Três Ilhoas”)[4], um século antes, onde três irmãs açorianas, também de Horta, na Ilha do Faial, vem para o Brasil, com a mãe viúva, e se tornam matriarcas de grandes ramos genealógicos mineiros, como os Junqueira, os Figueiredo e os Rezende.

Luiza Aurélia[5], ainda, foi protagonista de um ato heróico, ao salvar a imagem de Nossa Senhora da Conceição do incêndio que destruiu a Igreja Matriz de Viana em 1848, ao adentrar aquela igreja em chamas. Demonstrando seu espírito cívico, hospedou em sua casa, o Imperador D. Pedro II, quando da visita ao Espírito Santo em 1860, e cedeu esta mesma casa, durante os primeiros anos da sua existência, para as sessões da Câmara Municipal de Viana, instalada em 1862. Luiza faleceu quase centenária, aos 95 anos de idade.

Entre seus descendentes, encontramos o major Joaquim de Freitas Lira, seu filho, o consagrado músico Roberto Menescal e o desembargador Job Pimentel, ambos tetranetos, e Marcus Pimentel, filho de Job e pentaneto de Luiza, genealogista acima citado. O desembargador Job Pimentel, homenageado em Mantenópolis com o nome de uma escola, foi, ainda, o idealizador da construção do Cristo Redentor de Mimoso do Sul. Os “Pimentel”, vindos dos Açores para Viana, ainda deram Manoel Vieira Pimentel, prefeito de Viana, seus filhos Nelson (advogado e professor) e Olival (Juiz de Direito), além de José Pereira Pimentel, que foi consultor e irmão na Santa Casa de Misericórdia de Vitória. 

Após esses detalhes do início da colonização de Viana, veremos, agora, várias famílias de origem lusa, geralmente só paterna, posto que, como me referi anteriormente, a maioria dos imigrantes vinham solteiros. Vejamos algumas delas, em rápido resumo:

 

Grande Vitória

 

Aguiar

Francisco Coelho de Aguiar era natural da Ilha Terceira. Estabeleceu-se em Vitória antes de 1830, tendo sido Conselheiro Geral de 1830 a 1834. Seu único filho, Veríssimo, nos deu vasta descendência, entre eles os bisnetos João Duckla de Aguiar e Augusto Manoel de Aguiar Filho, deputados estaduais, Aristeu Borges de Aguiar, presidente do estado (1928-1930), e membro da Academia Espírito-santense de Letras. Os trinetos Eurico Salles de Aguiar, deputado federal e ministro de estado, homenageado com seu nome no Aeroporto de Vitória, e Jefferson de Aguiar, deputado estadual e senador. Não existe ligação, a princípio, entre essa família e os Aguiar do governador Francisco Lacerda de Aguiar, posto que esta última tem origem em Bananal (SP), e, remotamente, em Angra do Heroísmo, ou seja, na mesma Ilha Terceira. Pesquisas na própria Ilha, levariam a uma conclusão mais acertada.

 

Barbosa Leão[6]

Luiz Barbosa Leão chegou ao Espírito Santo por volta de 1840. Era primo do patrono da Polícia Militar do Espírito Santo, João Antunes Barbosa Brandão, visto sua mãe ser irmã do pai do referido patrono. Luiz Barbosa Brandão veio solteiro, em 1820[7], como a maioria dos portugueses que para cada vieram, casando-se com a irmã do padre Francisco Antunes Siqueira (pai). Luiz Barbosa Leão veio, também solteiro, na esteira do tio, anos depois e logo formou sua própria família. São inúmeros os seus descendentes que tiveram influência na sociedade, nas letras e na cultura capixaba. São por demais conhecidos seus netos Kosciusko Barbosa Leão e Aristóbulo Barbosa Leão, mestres de tantos capixabas e Monsenhor Luiz Cláudio de Freitas Rosa. Sua bisneta Judith Leão Castelo Ribeiro, educadora e primeira capixaba eleita para a Assembléia Legislativa estadual além de seus irmãos, detentores de alguns Cartórios na Grande Vitória. E suas famosas trinetas, Danuza, ícone da sociedade carioca, e Nara Leão, ícone da música popular brasileira, ambas nascidas em solo capixaba. A descendência de Luiz Barbosa Leão uniu-se a outras famílias capixabas, tais como, os “Castello” e os “Borges”, famílias tradicionais da Serra, cujas origens ibéricas se perdem nas brumas do tempo.

 

Câmara, Cruz, Gomes e Vianna Leal[8]

Mais um açoriano no Espírito Santo, Domingos da Silveira Vianna Leal, é um comerciante bem sucedido na Vitória, do final do século XIX e início do XX. Como não tinha descendência, traz, em 1928, a irmã, viúva, e suas duas filhas, uma das quais Maria das Dores) já casada com Manoel Câmara. É com a filha desse casal (Margarida) que Rubens Gomes, filho mais novo de outro luso, José Joaquim Gomes, se casará, e, após o encerramento das atividades hoteleiras, administrarão, como um colégio, o prédio do antigo Hotel Majestic, que fora o mais luxuoso hotel de Vitória, tendo, inclusive, elevador. Fundado por José Joaquim Gomes, foi inaugurado em 1926. Gomes, a princípio, estava baseado no Rio de Janeiro, vem para Vitória, onde inicia-se no comércio. Casa-se, em segundas núpcias, com Eugênia Vervloet, em 1901, neta de imigrantes belgas, de Santa Leopoldina, com a qual tem 9 filhos. Bem sucedido nos negócios, nos primeiros anos do século XX, culminou sua atuação com a inauguração do Majestic. No entanto, como que prevendo a crise mundial que explodiria em 1929, arrenda o hotel para seu genro, e depois, para outro compatriota, Júlio Teixeira da Cruz, e embarca para Portugal, de onde retorna no final dos anos 30, falecendo em 1942. José Joaquim também pode ser citado na história do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, posto que foi um dos fundadores do Clube dos Boêmios, primeira sede do IHGES, que, nos anos 70, foi demolida para construção do Edifício Domingos Martins. Da família Cruz, que a partir do arrendamento do Majestic, passou a dominar o setor hoteleiro em Vitória, tendo sob sua administração também o Sagres e o Estoril, temos como seu representante seguinte, o construtor Chrisógono Teixeira da Cruz, que chegou a prefeito de Vitória de 1971 a 1974. 

 

Duarte Carneiro

Nascido em São Lourenço de Carnide, próximo a Lisboa, o alferes Luiz Duarte Carneiro era provedor de Órfãos, de Vitória, nomeado que fora em 1732. Provavelmente teria se casado em Vitória, apesar de não termos essa confirmação. Entre seus descendentes, temos o neto Ignácio Pereira Duarte Carneiro, que foi encarregado de abrir a estrada para Minas, a conhecida estrada São Pedro de Alcântara, ou, ainda, estrada do Rubim, em 1817. Outro neto, primo de Ignácio, foi Marcelino Pinto Ribeiro, que, apesar de padre, foi pai de outro Marcelino Pinto Ribeiro Duarte, também padre, que foi deputado provincial, deputado geral, e, quando da fundação da Academia Espírito-santense de Letras, tornou-se patrono de sua Cadeira nº 1. Este segundo padre foi pai de outro Marcelino Pinto Ribeiro Duarte, que era médico em Vitória, em 1870, segundo Daemon.[9] É a filha desse médico, Maria Espíndula de Freitas Rosa que desposará o primeiro presidente do estado, Affonso Cláudio, e será mãe de Alarico de Freitas, deputado estadual em algumas legislaturas, entre outros. Entre os descendentes de Ignácio Pereira Duarte Carneiro, pela parte materna, encontramos o mesmo desembargador Job Pimentel, acima citado, que descende por seu pai, dos Pimentel, açorianos que colonizaram Viana.

 

Laranja

A movimentação de portugueses (1808-1842)[10] nos mostra a entrada de José Francisco Gonçalves Laranjo, oriundo da Ilha do Faial (Açores). Aqui chegou, em 1820, pela primeira vez, retornando em 1822, provavelmente em definitivo. É o genearca da família Laranja, que nos deu alguns deputados provinciais e estaduais, além do prefeito de Vitória, Hermes Laranja. Francisca, filha de José Francisco, foi esposa do patrono da Polícia Militar do Espírito Santo, João Antunes Barbosa Brandão, fazendo, assim, ligação com outra família de portugueses, os “Barbosa Leão”, acima descritos.

 

Monjardim[11]

Monjardim não é italiana, dirão alguns? Bem, Lazzaro Mongiardino, genovês, migrou para Portugal no início do século XVIII. Lá, foi pai de Caetano Monjardino, que já aportuguesa o nome italiano. E Caetano foi pai de Ignácio João Monjardino, que, por volta de 1782, já estava no Espírito Santo. Aqui casou-se com Anna Luísa Pinto e, portanto, genearcas dos atuais “Monjardim”, uma vez que seu filho José Francisco aportuguesou de vez o nome, que se mantem assim já a 2 séculos. Ignácio é o homem que exerceu o poder por mais tempo, no Espírito Santo, atingindo 16 anos de forma ininterrupta. O filho José Francisco, que dá nome à rua Coronel Monjardim, é responsável por grande prole, entre eles Alpheu Adelpho, o barão de Monjardim, político de destaque como o pai, tendo sido, ambos, deputados provinciais, e o barão, deputados estadual, além de exercer, por breve período, a presidência do estado. Entre os descendentes dos dois casamentos do barão, temos seus filhos José Francisco, deputado estadual e federal em diversos mandatos, Manoel Silvino, médico e deputado estadual em diversos mandatos, Américo e Adelpho, que foram prefeitos de Vitória. Seu neto Alcebíades Guaraná Monjardim foi deputado federal além de pai da consagrada cantora carioca Maysa e avô do diretor de televisão Jayme Monjardim. Vários outros membros exercem as funções de advogado, médicos e engenheiros, espalhados ppor vários estados do Brasil.

 

Pacheco[12]

José Antonio de Souza Pacheco chegou ao Espírito Santo nas últimas décadas do século XIX, fixando-se em Vila Velha. Avô paterno de Renato Pacheco, conceituado jurista, escritor, professor, romancista, poeta e historiador capixaba e Rogério, odontólogo. Bisavô de Renata, juíza de Direito, Rodrigo, advogado, Ana Lúcia, professora e Carlos Thomé, odontólogo.

 

Pinto Ribeiro

O capitão-mor Manoel Pinto Ribeiro era nascido em São Payo de Oliveira, concelho de Lamego. De seu primeiro casamento, teria tido o Gonçalo Pereira Porto Sampaio, citado no tópico dos “Monjardim”. E de seu segundo casamento, a descendência já citada no tópico “Duarte Carneiro”. Ainda sem comprovação (mais uma vez...) uma provável filha dele (imã inteira de Gonçalo), seria a matriarca dos “Azambuja Meirelles” da Serra. Manoel Pinto Ribeiro é, além disso, ancestral de todos os “Monjardim” atuais.

 

Pinto Homem de Azevedo

Os “Pinto Homem de Azevedo” são originários da freguesia de Santa Eulália de Oliveira, atual Oliveira, no concelho de Barcelos, Portugal. Seu representante mais importante, no Espírito Santo, foi Francisco Pinto Homem de Azevedo, que foi Conselheiro-Geral, deputado provincial e vice-presidente da província, tendo exercido a presidência em várias oportunidades. Casa-se com a filha de Gonçalo Pereira Porto Sampaio, o construtor do atual Solar Monjardim. Esse Gonçalo, brasileiro, capixaba, era neto de outro Gonçalo Pereira Sampaio, já morador em Vitória no final do século XVII, este sim português, de São Martinho de Caramos, concelho de Braga. Persistem ainda algumas dúvidas quanto a essas sequências genealógicas, que, no entanto, são muito prováveis, pela época e pelos nomes dos envolvidos. Essa impossibilidade de comprovação deve-se àquela citação anteriormente feita, do desaparecimento dos diversos livros eclesiásticos dos primeiros 300 anos de nossa capitania. Proprietário, por dote, do atual Solar Monjardim, era foi pai de Ana Francisca, que contraiu matrimônio com José Francisco de Andrade e Almeida Monjardim. Irmão de Francisco, José Pinto Homem de Azevedo foi padre, tendo nascido em Vitória em 1760[13]. Uma irmã, casada com José Ribeiro Pinto, foi mãe do chamado desembargador Sampaio, qual seja, Manoel Pinto Ribeiro Pereira de Sampaio (1783-1857), primeiro e único capixaba a presidir o Supremo Tribunal Federal (na época, Supremo Tribunal de Justiça), de 1856 até sua morte, no ano seguinte[14].

 

Tovar

Manoel Vieira de Albuquerque Tovar governou o Espírito Santo entre 1804 e 1811. Basílio Daemon cita que, ao deixar a Capitania, deixou aqui 2 filhos naturais[15]. Aires Vieira de Albuquerque Tovar seria um desses filhos. Jovem, ainda, ingressa no exército, atingindo o posto de alferes, resignando ao posto em 1834, passando a dedicar-se à lavoura. Trás para Vitória a primeira tipografia da província, onde intentou editar um periódico (O Estafeta), do qual há notícia da edição de apenas o primeiro número, em 1840. Adoentado, veio a falecer no ano seguinte, deixando um filho, de igual nome, que deixou numerosa descendência na capitania e, no depois estado. Seus bisnetos Jair Tovar (que foi deputado estadual) e José Francisco Monjardim Filho foram membros da Academia Espírito-santense de Letras. Entre os trinetos, temos José Tovar Pimenta, que exerceu a procuradoria do estado, Cláudio Ferreira Tovar, que é ator conceituado no Rio de Janeiro e João Luiz de Albuquerque Tovar Neto, que exerceu vários cargos na administração pública estadual. Vários outros descendentes exercem a advocacia e a medicina, no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, para onde parte dos descendentes se transferiram, em meados no século XX.

 

Outras famílias

Temos diversas outras famílias, na Grande Vitória, que tem se dedicado ao comércio, como “Fernandes Moça”, no ramo de comércio de ferragens, família à qual pertence a atual primeira-dama do estado, sra. Maria Virgínia, e Pais, no ramo de materiais de construção, imigrantes chegados em meados do século XX.

 

Interior

 

Beiriz[16]

Como tantos portugueses que desembarcaram no Brasil do século XIX, fugindo da penúria e na tentativa de melhorar a vida, Manoel da Costa, viúvo recente, vem para o Brasil, por volta de 1858, com seus 3 filhos solteiros, fixando-se na região de Iconha e Piúma. Dos 3 filhos que vieram para o Brasil, Antonio acaba por retornar à cidade natal, onde falece sem herdeiros em 1915. José e Manoel por aqui se estabeleceram e constituíram família. Enquanto seus irmãos se mantiveram Gonçalves da Costa, José adicionou ao nome o toponímico Beiriz, de sua cidade de origem, ficando assim conhecido, e repassando esse nome aos descendentes. Torna-se fazendeiro e, ao associar-se a Antonio José Duarte, domina grande parte do comércio da região, chegando a ter uma casa bancária em nome da sociedade, que auxiliava o desenvolvimento da região de Piúma e Iconha.

 

Bello de Araújo[17]

Originários de 3 irmãos (Joaquim, José e Manoel) que chegaram a Itapemirim entre 1840 e 1845. Do casamento de Joaquim com Josefa, filho de Domingos Souto, nasce Ana, que, ao casar com Joaquim Pires de Amorim, origina os “Bello de Amorim”, com larga descendência na região de Cachoeiro de Itapemirim, e Rio de Janeiro.

 

Duarte[18]

Antonio José Duarte, natural de São Payo de Merlins, foi parceiro e sócio de José Gonçalves da Costa Beiriz, na empreitada de colonizar e dotar a região de Iconha e Piúma de condições para se desenvolver. Em Iconha, em 1884, celebrou seu casamento, com uma filha da terra. Sua filha Argentina contraiu matrimônio com Idylio, filho do sócio e amigo, unindo as famílias definitivamente, além do enlace econômico que já existia.

 

Durão[19]

José Joaquim Durão era natural do Porto, e aqui chegou antes de 1865, posto que seu primeiro filho nasce neste ano, já em Linhares. Seu bisneto Luis Cândido Durão foi prefeito por duas vezes, deputado federal, também por duas vezes e atualmente é deputado estadual.

 

Fundão

Família de origem portuguesa, que auxiliou na povoação do norte do estado, notadamente a região de São Mateus, onde tiveram forte atuação política. Provavelmente é mais um caso de toponímia na formação do sobrenome, posto que há indícios que o genearca da família seja originário da cidade de Fundão, em Portugal.

 

Pires de Amorim[20] 

José Pires de Amorim era nascido em Passo de Averomar, freguesia de Santiago de Amorim, de onde vem a complementação de seu nome (mais um sobrenome toponímico), comum a vários portugueses que aqui chegaram, para melhor serem identificados. Inicialmente a família estabeleceu-se no interior do Rio de Janeiro, vindo para o Espírito Santo por volta de 1852, já com vários filhos. Dentre seus membros temos seus filhos (que, por parte de mãe, são sobrinhos do Barão de Guapy): Joaquim Pires de Amorim, republicano histórico, foi o primeiro juiz federal do Espírito Santo, de 1890 a 1901, Diogo Pires de Amorim, republicano histórico e vereador em Cachoeiro de Itapemirim, Eugênio Pires de Amorim, médico e senador pelo Espírito Santo, de 1893 a 1897, monsenhor João Pires do Amorim, que, após passar por algumas paróquias, foi nomeado para o Rio de Janeiro, onde ficou de 1885 até sua morte, em 1914. Foi defensor e auxiliou sobre maneira no estabelecimento do bispado do Espírito Santo, finalmente crido em 1897.

 

Santos Neves

Os “Santos Neves” têm origem no casamento de Antonio José dos Santos com uma filha de Manoel Castro Neves (da qual ainda não obtive o nome), em Salvador, na Bahia, ou, segundo alguns, ainda em Portugal, na freguesia de Ramalde. Dois (ou três, há uma dúvida ainda não esclarecida) filhos desse casal estabeleceram-se no Espírito Santo, mais precisamente em São Mateus. Desses primeiros “Santos Neves” tivemos Graciano Santos Neves Júnior exercendo a presidência do estado em duas oportunidades. O primo de Graciano Júnior, João, casa-se com uma portuguesa (D.Albina Gonçalves Morgado Silva), reforçando a ligação com a terra lusa. Tornam-se pais de Jones Santos Neves, governador do estado em dois períodos, Guilherme Santos Neves, nosso maior folclorista e o médico Jayme Santos Neves. Temos, ainda, os escritores Luiz Guilherme e Reinaldo, filhos de Guilherme, e, portanto, netos de uma portuguesa.

 

Souto

Domingos Rodrigues Souto, nascido em Guimarães, foi comendador da Ordem da Rosa. Deputado provincial por várias legislaturas. Esteve ligado, a princípio, com a fundação de Cachoeiro de Itapemirim, fixando-se, posteriormente, em Vitória, onde faleceu. Seus descendentes ligaram-se a várias famílias da província e depois, do estado, como os “Bello de Araújo” e “Pires de Amorim”. Uma de suas filhas (Lucrécia) foi casada com Manoel Rodrigues de Campos, e foram pais do marechal Manoel Rodrigues de Campos. Outro neto, filho de sua filha Carolina, Domingos Vicente Gonçalves de Souza (1842-1916), estabelece-se na mesma Viana, acima citada, sendo vereador em várias legislaturas, além de exercer diversos cargos na esfera estadual e chegando ao Senado Federal (1891-1897) e em 1914, nos últimos dois anos antes de seu falecimento. Sua trineta Alda Magalhães casou-se com Jones Santos Neves, e foi primeira-dama estadual, em mais uma interligação de famílias com origem portuguesa.

 

Outras famílias “mineiras”

São muitas as famílias atuais com ascendência lusitana, quer do continente, quer das ilhas. As acima, tiveram origem no Espírito Santo, desde a época da capitania. Ainda temos outras, que iniciadas em outras capitanias, para cá mandaram alguns de seus descendentes que acabaram influenciando a vida capixaba. Vejamos algumas:

 

Monteiro[21]

Os Monteiro iniciaram-se no Brasil por volta de 1770, com a chegada de Antonio de Souza Monteiro, à região próxima a Mariana. Ali nasceu o primeiro Monteiro em solo nacional, qual seja, outro Antonio de Souza Monteiro, pai de Francisco, que, ao casar, muda-se para a região de Cachoeiro de Itapemirim, onde nascem os netos Jerônimo e Bernardino, ambos presidentes do estado, D.Fernando, segundo bispo do Espírito Santo, os bisnetos Henrique Novaes, que foi senador e Maria Stella de Novaes, uma de nossas primeiras intelectuais, Nelson Goulart Monteiro, deputado, Carlos Fernando Monteiro Lindenberg, governador em dois mandatos e senador, Moacyr Avidos, prefeito de Vitória e o trineto Carlos Fernando Monteiro Lindenberg Filho (Cariê), jornalista e músico.

 

Nogueira da Gama

O madeirense Tomé Rodrigues Nogueira do Ó veio para o Brasil por volta de 1710. Seu filho Nicolau Antonio Nogueira vem a ser o genearca dos “Nogueira da Gama”, ao casar-se com Ana Joaquina de Almeida Gama. Três filhos desse casal estão intrinsecamente ligados ao Espírito Santo: Francisco Antonio e Antonio Joaquim, cujos filhos casaram-se e são a origem dos “Nogueira de Gama” de Linhares, e Maria Custódia, que, ao casar-se com Mateus Herculano Monteiro da Cunha Matos dá origem aos “Nogueira de Gama” da região de Cachoeiro de Itapemirim. De Linhares, temos os primeiros povoadores do município, que, ao se unirem aos “Calmon” (baianos de origem francesa), nos deram Celso Calmon Nogueira da Gama, que foi desembargador e eventual substituto do interventor Bley, e seu neto José Paulo Calmon Nogueira da Gama, atualmente desembargador, além de Monsenhor Eurípedes Pedrinha. De Cachoeiro de Itapemirim, temos Francisco Xavier e Francisco Herculado, respectivamente filho e neto do casal genearca, vereadores e deputados ainda ao tempo de Império, além do tetraneto Oscar de Almeida Gama Filho, escritor conceituado no estado.

 

Rezende[22]

Nascido na Ilha de Santa Maria, nos Açores, João Rezende da Costa casa-se no Brasil, em 1726, justamente com a mais nova das Três Ilhoas, anteriormente citadas. Entre seus descendentes, com atuação destacada no Espírito Santo, temos os governadores Eurico Vieira de Rezende e Cristiano Dias Lopes Filho, o senador Ricardo de Rezende Ferraço e o desembargador Anníbal de Rezende Lima

Temos muitas outras famílias, no âmbito genealógico, dentro do estado. Numerar todas torna-se uma tarefa hercúlea. Várias das famílias acima citadas estão entrelaçadas, com a ocorrência de casamento entre seus membros. Há, ainda, ligações com italianos, germânicos, estadunidenses, negros, índios, o que mais uma vez vem fortalecer a tendência de miscigenação da população capixaba e da brasileira, como um todo. Demonstrar todas essas ligações tomaria um tempo excessivo. É pretensão futura publicar as pesquisas que venho desenvolvendo já há mais de 13 anos, que, aliada a pesquisas de terceiros, já me proporcionaram um arquivo com cerca de 90.000 nomes, abrangendo boa parte dos séculos XIX e XX, da genealogia capixaba, e já adentrando o século XXI, que já está na sua segunda década.

 

Autor: Paulo Stuck de Moraes - Vice-Presidente do IHGES
Fonte: Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, nº 66, 2011



 

Referências Bibliográficas 

[1] Ver Primeiras famílias do Rio de Janeiro, de RHEINGANTZ, Carlos G.

[2] É a designação dada aos descendentes de ibéricos que se mantiveram sem miscigenação

[3] Há, na internet, várias páginas onde se pode verificar tal genealogia, além de trabalhos executados pelo Instituto Argentino de Ciências Genealógicas.

[4] Ver As Tres Ilhoas, de GUIMARÃES, José.

[5] Ver Os açorianos na capitania do Espírito Santo e a fundação da povoação de Viana – 1813-1822, de PIMENTEL, Marcus Benatti Antonini Rangel.

[6] Ver Revista do IHGES nº 31/33, de 1969.

[7] Movimentação de portugueses 1808-1842, Arquivo Nacional

[8] Ver Hotel Majestic, de GOMES, Rubens Manoel, Câmara

[9] Ver Província do Espírito Santo, de DAEMON, Basílio de Carvalho.

[10] Pesquisa levada a termo pelo Arquivo Nacional.

[11] Ver Os Monjardinos, de FORJAZ, Jorge Pamplona

[12] Ver Renato José Costa Pacheco – 1928-2004, de MORAES, Paulo Stuck.

[13] Habilitação de gênere arquivada na Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro.

[14] Ver página do Supremo Tribunal Federal, na internet.

[15] Ver Província do Espírito Santo, de DAEMON, Basílio de Carvalho.

[16] Ver Revista do IHGES nº 36, de 1985.

[17] Ver Genealogia Capixaba, de AMORIM, Joaquim Pires de.

[18] Ver História de uma colonização, de SIMÃO, Idalgiso.

[19] Ver Guia histórico e geográfico das ruas de Linhares, de HOLLIDAY, Patrick Mário Calmon, et alli.

[20] Ver Um dos primeiros habitantes de Cachoeiro, de AMORIM, Joaquim Pires de.

[21] Ver Jerônimo Monteiro, de NOVAES, Maria Stella de.

[22] Ver Família Rezende e Família Vieira de Rezende, de CARREIRO, Robson Rezende.



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Duarte de Lemos – (c. 1485-1558)

Duarte de Lemos, como estátua orante, na localidade da Trofa.Tal exemplar de estatuaria tumular lusitano é considerada “uma das obras mais belas e viris da nossa galeria de retratos plásticos”

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Carta de fundação da vila de Guarapari

Registro da carta de fundação da vila de Guarapari, na província do Espírito Santo, copiada do Livro de Registro da Câmara Municipal daquela vila, 1679

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Dos Emboabas ao Monte Líbano - Capítulo I

Os Monteiros distraíam-se com troças, brincadeiras simples, mormente no Carnaval e nas Aleluias, quando, na Fazenda Monte Líbano

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Nobreza Capixaba

Os nobres capixabas comprovados são apenas três (barões de Aimorés, Monjardim e o terceiro de Itapemirim), havendo dúvidas quanto ao barão de Guandu e ao barão de Timbuí 

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