As medidas do Presidente – Por Pedro Maia
Alfredo ficou satisfeito quando soube que ontem ia ser ponto facultativo nas repartições públicas. Como barnabé de ofício, ele estava ansioso para ver as medidas tomadas pelo Presidente e que seriam anunciadas às sete da manhã. Como não teria que enfrentar o batente no dia seguinte, resolveu ir tomar umas e outras em um dos bares ali de Jardim da Penha, onde chegou empolgado pela posse do novo mandatário da República.
— Agora sim, o Brasil vai encontrar seu rumo! As medidas do Presidente vão traçar uma nova política econômica e social para o País! Marajá vai ter que piar baixinho e a ganância dos comerciantes vai enfrentar a dureza do Tuma. O pau vai quebrar! — dizia o Alfredo, cheio do ardor cívico.
E, com a chegada de amigos, esse ardor cívico foi sendo incrementado pelo ardor do álcool ao ponto que, antes das nove, o Alfredo já resolvera passar a noite em claro para saber, de primeira mão, as "medidas do Presidente". Nessas alturas os papos variavam e as opiniões também:
— Pois é - dizia um petista de quatro costados, barbudo e irascível — parece até coisa do Jânio Quadros. Vocês se lembram que o Jânio condecorou o Che Guevara? Agora o próprio chefe do Che vem à posse em pessoa. Macho tá ali...
— Macho nada! - contestava o Alfredo — macho mesmo é o Presidente eleito. Tu vai ver amanhã, quando ele revelar as medidas dele. Aí sim, é que a onça vai beber água...
Do outro lado da mesa, um cidadão mais cabreiro se infiltrou no papo:
— Num sei não. Mas acho que já vimos este mesmo filme...
Nesta, o Alfredo pulou nas tamancas:
— Deixa disso, ô cara! Tu é pessimista mesmo! Tu sobe escada para não subir de elevador. Espera só pra ver as medidas do homem...
Então chegou ao bar a notícia do aumento dos combustíveis, o petista aproveitou e mandou brasa:
— Tá vendo só, ô otário? O homem fechou os bancos, deixou todo mundo duro e ainda por cima já aumentou a gasolina, o gás e o álcool...
A notícia pegou o Alfredo meio de surpresa, mas ele logo se recuperou:
— Isso faz parte da estratégia do homem. Vocês vão ver daqui a pouco as medidas do Presidente. Aí sim é que a cobra vai fumar...
E no aguardo do dia amanhecer, para se saber as "medidas do homem", foram rolando as biritas, das mais variadas formas, até que lá pras tantas o Alfredo não aguentou e emborcou na mesa. Mas antes recomendou ao garçom que o acordasse às dez pra sete, pois ele tinha que saber das tão anunciadas "medidas presidenciais".
Exatamente no horário o garçom balançou o Alfredo, que dormia a sono solto, com a cabeça sobre a mesa, mais bêbado do que gambá em alambique:
— Seu Alfredo, tá na hora! - avisou o garçom
O Alfredo levantou a cabeça e indagou:
— Na hora de que, ô meu?
— Na hora de saber das medidas do Presidente, ora essa.
Foi aí que o Alfredo respondeu convicto:
— Pô, ô cara, não enche o saco! Quem tem que saber das medidas do Presidente é o alfaiate dele...
E continuou a dormir sobre a mesa o sono dos justos.
Estava ali um brasileiro liberto.
Capa: Helio Coelho e Ivan Alves
Projeto Gráfico: Ivan Alves
Edição: Bianca Santos Neves
Lúcia Maria Villas Bôas Maia
Revisão: Rossana Frizzera Bastos
Produção: Bianca Santos Neves
Composição, Diagramação, Arte Final, Fotolitos e Impressão: Sagraf Artes Gráficas Ltda
Apoio: Lei Rubem Braga e CVRD
Fonte: Cidade Aberta, Vitória – 1993
Autor: Pedro MaiaCompilação: Walter de Aguiar Filho, agosto/2020
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