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Cariocas X Capixabas - Por Sérgio Figueira Sarkis

Em baixo, à esquerda, parte da placa de identificação do escritório de Western Telegraph Company, ao lado da agência central dos Correios, na Av. Jerônimo Monteiro, no centro de Vitória

Nos idos do final da década de 1910, e início da de 1920, embora já existisse luz elétrica, Vitória não dispunha de rádios com capacidade de recepção dos programas transmitidos pelas emissoras da Capital do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro.

Mas, como estava programado um jogo de futebol, a ser realizado em um domingo, no campo do Fluminense, entre as seleções dos Cariocas e a dos Capixabas, o que fazer para acompanhar o desenrolar da peleja, já que nem todos poderiam se deslocar para o Distrito Federal e assistir ao vivo a contenda.

Odilon Grijó, o famoso Neném, pessoa muito bem-querida na cidade, eloquente, brincalhão e, principalmente, excelente orador, teve a feliz ideia de fazer a irradiação. Mas de que forma? Não havia como transmitir. Como fazer?

Ele procurou a Western Telegraph, companhia inglesa de envio de telegramas, através de cabos submarinos, por todas as partes do mundo. Ela ficava num prédio ao lado do ocupado atualmente pelo Correio. Ou seja: bem próximo da Praça Oito. Aliás, justifica-se a escolha da Western, em vez dos Correios, em função da velocidade de transmissão, infinitamente superior à da empresa nacional.

Neném, após o acerto com a Western, fez rodar panfletos nos quais convidava o povo para uma concentração na Praça Oito, quando então o jogo seria transmitido. Às 15:30 horas do dia acertado, já quase não cabia mais ninguém no local. Muitos tiverem de ficar na rua, no espaço onde, posteriormente, foi erigido o relógio, lá até hoje.

Quando dá 16:00 horas em ponto, aparece Neném Grijó com um megafone as mãos. Levando-o à boca, dá boas-vindas a todos e esclarece que será praticamente um porta-voz dos acontecimentos. Ele, de 15 em 15 minutos, irá até à Western e receberá um telegrama de uma pessoa colocada em ponto estratégico dentro do estádio, informando o desenrolar da peleja.

Dito e feito! Correu para lá e voltou célere, com um telegrama às mãos. Abrindo-o à frente de todos, noticiou:

— O jogo começou. Os espectadores voltaram a tratar de assuntos amenos. Após 15 minutos, volta Neném, com outro telegrama. Abrindo-o, lê:

— O jogo continua sem alteração no placar.

Passados os outros 15 minutos, Neném, com visível alegria, comunica que os capixabas fizeram o primeiro gol da partida, aos 25 minutos. Alegria geral, fogos, gritos, euforia total.

No período de tempo a seguir, Neném abre novo telegrama e informa:

— Primeira etapa encerrada.

Após o intervalo decorrido para início do segundo tempo, Neném comunica:

— Iniciado o segundo tempo.

Daí para frente, o protocolo de transmissão transcorreu praticamente igual ao anterior, só chamando atenção o fato de Neném não ler mais os telegramas, passando a informar apenas que o jogo transcorria normalmente.

Passado o período de 45 minutos do segundo tempo, Neném, com o telegrama aberto às mãos, comunica:

— O jogo terminou três a um para os cariocas.

Quase foi linchado.

 

Fonte: No tempo do Hidrolitol – 2014
Autor: Sérgio Figueira Sarkis
Compilação: Walter de Aguiar Filho, março/2019

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